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82,70% não querem presídio na cidade



82,70% não querem presídio na cidade
Depois da divulgação da notícia de que o governo do Estado pretende construir um CDP – Centro de Detenção Provisória - em Fernandópolis, a sociedade civil ligou o sinal de alerta máximo. As entidades, associações e clubes de serviço têm reunião marcada para a próxima terça-feira, 14, convocada pela Associação de Amigos do Município, na sede da OAB, onde o tema será debatido.

Antes disso, na quinta-feira, 9, a Câmara Municipal, por iniciativa do presidente Ademir de Almeida, realizou reunião para tratar do tema, com a presença de quatro juízes (Alceu Corrêa Junior, Evandro Pelarin, Heitor Miura e Ricardo Felício Scaff), um promotor (Denis Henrique Silva), a prefeita Ana Bim, sete vereadores, autoridades militares, delegados de polícia e representantes da sociedade civil.

A tônica foi a posição contrária à construção do CDP, apesar do delegado Renato Góes dizer que é contrário, por questões estruturais e de localização, à reforma da velha cadeia pública da cidade.

O promotor Denis salientou que a existência de uma penitenciária numa cidade é sempre deletéria, trazendo os mais variados problemas sociais. O vereador Alaor Pereira Marques vaticinou que “logo esse CDP se transformaria num CDD – Centro de Detenção Definitiva”, em alusão à constante utilização dessas unidades para manter sentenciados em vez de se destinar às prisões temporárias.

O juiz Evandro Pelarin foi incisivo: “deveríamos ter sim uma cadeia pública segura e administrada pela Polícia Civil. CDP, só se o governo nos enfiar goela abaixo”, bradou.

O advogado José Humberto Merlim disse que, por se tratar de um assunto complexo, outras reuniões deverão ser realizadas, além de se fazer um trabalho político junto ao governo do Estado.

O jornal CIDADÃO realizou enquete no centro da cidade, na última quarta-feira, 8. Diante da pergunta: “Você é contra ou a favor da instalação de um Centro de Detenção Provisória na cidade de Fernandópolis?”, 82,30% das pessoas ouvidas se declararam contra, e 17,30% se manifestaram favoravelmente.

Na cidade, os comentários entre os formadores de opinião e representantes de entidades parecem acompanhar o resultado da enquete popular. Na reunião da próxima terça-feira, deverão manifestar sua posição contrária à implantação do CDP Durval Resende Filho, presidente do Rotary Clube de Fernandópolis – “nem em Rio Preto essa experiência funcionou”, disse ele, que definiu a postura oficial juntamente com os companheiros de clube; Gentil Sandrin, do Rotary Clube 22 de Maio, e Marcelo Teixeira, do Lions Clube Fernandópolis.

Já Paulo Eduardo Zucareli, presidente do Lions Clube Cidade Progresso, afirmou que prefere esperar o debate de terça-feira para firmar posição: “ainda é muito cedo para uma atitude definitiva”, disse.

Outra questão que vai gerar muita polêmica é a emenda à Lei Orgânica do Município, de autoria do vereador Etore José Baroni, aprovada em 27 de junho de 2001, e que deu esta redação ao artigo 233: “fica proibida a construção, instalação e funcionamento de todo e qualquer presídio, instituto penal ou prisional, destinados ao abrigo de condenados a pena privativa de liberdade”. Embora haja quem entenda que esse veto não abrange o CDP (na detenção provisória, o preso evidentemente ainda não sofreu sentença condenatória), o fato é que a intenção governamental de construir o CDP pode esbarrar nesse dispositivo da LOM.

Nessa hipótese, será preciso que a prefeita apresente um projeto à Câmara para modificar a lei ou argüir sua inconstitucionalidade.

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HERANÇA DO CARANDIRU

O que está ocorrendo no sistema prisional paulista, segundo o secretário da segurança pública municipal de Hortolândia, na região de Campinas, Osny José Rodrigues da Silva, é que, após a desativação do Carandiru, que chegou a manter 8 mil presos, “o governo passou a mandar os detentos da Grande São Paulo para o interior”.

Hortolândia tem nada menos do que três das 144 unidades prisionais mantidas pela Secretaria de Administração Penitenciária do Estado. A população carcerária da cidade ultrapassa os 9 mil sentenciados, o que provoca problemas de toda ordem.

Osny narra alguns deles: “o deslocamento de policiais militares para serviços de escolta, em vez de atuarem no patrulhamento preventivo; a vinda de muitas famílias de presos para a cidade, afetando os programas de Habitação, Saúde e Educação, e ainda aumentando as ocorrências policiais, especialmente em casos de furto e tráfico de drogas; as fugas, especialmente nos períodos de indulto de Natal e Dia das Mães; e as rebeliões, que sempre provocam comoção pública e sensação de insegurança”, enumerou.

O secretário conta que o Córrego Jacuba, o principal curso d’água do município, está sendo poluído pelos dejetos do presídio, que não tem sistema de tratamento de esgoto.

Reconhecendo que “em algum lugar os presos têm que ficar”, Osny faz um alerta: “caso Fernandópolis não consiga se livrar do CDP, será fundamental que sejam feitas exigências, postas no papel em forma de lei e com a assinatura do governador. Depois que o governo instalar o presídio, ficará muito mais difícil obter compensações”, aconselhou.

A prefeita de Fernandópolis, Ana Bim (PDT) declarou recentemente, através de nota de sua assessoria de imprensa, que ainda não tem uma posição oficial sobre o assunto, “preferindo ouvir primeiro a sociedade”. Segundo a prefeita, “a vontade do povo será a minha vontade”.

Normalmente, as diretorias dos CDPs acabam sendo constituídas pelos próprios delegados de polícia que atuam no município. A administração pública municipal não tem qualquer ascendência sobre essa direção, já que se trata de instituição prisional pertencente ao Estado.


PRÉDIO PADRÃO
Atualmente, o Estado de São Paulo conta com 32 CDPs, existindo um modelo-padrão para as unidades. Os prédios são capacitados para receber 768 detentos. Alguns deles, como os de Americana e Sumaré, mantêm modelos de re-socialização, proporcionando condições de trabalho e encaminhamento profissional ao final da pena.

Essas, porém, são exceções. O Estado tem hoje uma população carcerária próxima dos 150 mil detentos, a grande maioria ociosa. Mesmo assim, há só duas unidades de Instituto Penal Agrícola (IPA), exatamente em Bauru e São José do Rio Preto. Os presídios de segurança máxima são apenas três (Presidente Bernardes, Taubaté e Avaré). Só em 2006, aconteceram 90 rebeliões no Estado.

O advento de presídios aumenta o trabalho de muitos setores, sem que isso implique algum tipo de retorno financeiro. O Instituto de Criminalística de Votuporanga, por exemplo, praticamente triplicou seu trabalho depois que começou a atender às ocorrências da penitenciária de Riolândia. Hospitais freqüentemente atendem casos de presos doentes ou feridos em brigas.

O medo físico é outro fator que certamente prejudicará a qualidade de vida dos fernandopolenses. O oficial de Justiça José Lucheta conta que, na infância, morava num sítio em Piquerobi, cidade próxima a Presidente Wenceslau e Presidente Bernardes, onde há presídios. Quando ocorriam fugas, a população ficava no interior das casas à noite, apavorada e sem conseguir dormir.

De manhã, quando ia para a escola, distante 10 km, Lucheta forçava seu cavalo a correr a toda, de puro medo de um encontro com os fugitivos.

A deputada estadual Ana Perugini (PT) apresentou na Assembléia Legislativa um projeto que cria uma “lei de compensação”, para municípios que tiverem presídios em seus territórios. Esse projeto já recebeu pareceres favoráveis nas comissões parlamentares, mas ainda não tem previsão de quando irá a votação.


PSDB é o “pai da criança”

Essa “conquista”, certamente Votuporanga não vai querer tomar de Fernandópolis. Afinal, desde que Serra venceu as eleições, e antes mesmo de tomar posse, praticou atos de protecionismo explícito em relação à terra de Carlos Pignatari. Parece óbvio que não irá o governador tucano mandar essa “bucha” para os votuporanguenses.

E os tucanos, pelo que se vê, querem mesmo jogar a bomba em nossas mãos. Já no domingo, 5, a “Coluna do Diário”, assinada pelo jornalista Alexandre Gama no Diário da Região, de Rio Preto, trazia a informação de que o deputado estadual Vaz de Lima, que nasceu em Fernandópolis, defende a proposta de instalar o CDP por aqui.

O parlamentar sustentou o seguinte: “meu entendimento é de que a sociedade tem de arcar com as conseqüências do que ela produz. Assim como o lixo e o esgoto. Não é diferente quando se fala em presídio. Cabe ao Estado resolver o problema de onde colocar os que infringem a lei”.

Outro nome expressivo do PSDB – e, curiosamente, também nascido em Fernandópolis – a se considerar o que disse um militante tucano da cidade, que preferiu o anonimato, também seria favorável ao CDP. Trata-se do deputado federal Julio Semeghini. Segundo esse seu companheiro de partido, “o Julio não quer levar presídio para a terra da mulher dele”.

Boatos ou não, o fato é que em pouco tempo a região recebeu mais dois presídios em Rio Preto, duas unidades da Febem (Fernandópolis e Mirassol) e uma penitenciária em Riolândia. Um ônus que nem sabemos se poderemos suportar. A região precisa é de escolas, hospitais e indústrias que gerem empregos. Não podemos suportar tanto lixo e tanto esgoto, como sugere o nobre deputado Vaz de Lima.