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A dramática história de Milton Terra Verdi completa 60 anos



A dramática história de Milton Terra Verdi completa 60 anos

Uma avenida com apenas 24 quadras que atravessa o centro de Fernandópolis, separando as praças Joaquim Antonio Pereira e da Igreja Matriz Santa Rita de Cássia, carrega uma história que está completando 60 anos neste sábado, 29 de agosto. A antiga Avenida Seis, batizada com nome de Milton Terra Verdi é a homenagem que Fernandópolis prestou ao então jovem piloto, cuja história virou o livro “Diário da Morte”. 
29 de agosto de 1960, essa foi a data que Milton Terra Verdi, acompanhado do cunhado Antonio Augusto Gonçalves, fez um pouso forçado em meio a uma floresta boliviana, permanecendo por 70 dias aguardando o resgate, que não chegou. Ambos morreram de sede e fome.
Se estivesse vivo, Milton teria hoje 86 anos de idade. Filho de Manoel de Oliveira Verdi, o Neca Verdi, e Mariana Sodré, a dona Filhinha, como era conhecida. O nome da família Verdi, de Rio Preto, sempre esteve também muito ligado a Fernandópolis e isso desde os primórdios. A família se mudou para Fernandópolis antes dos anos 50. Vejam que em 1951, conforme revela o livro “Nossa História – Nossa Gente” –, o patriarca da família Manoel de Oliveira Verdi (Neca Verdi), que tinha propriedade rural no município, disputou eleições como candidato a vice-prefeito e, mais tarde, em 1956, candidato a prefeito de Fernandópolis. Em 1982, Manoel Terra Verdi (irmão de Milton), seguindo os passos do pai, também disputou eleição de prefeito em Fernandópolis. Hoje cuida dos negócios da família em Fernandópolis. Quando ocorreu o acidente com irmão, Manoel tinha 14 anos e morava em Rio Preto. 
O DIÁRIO 

Quando o Cessna 140 decolou do aeroporto de Corumbá (MS) às 13h30 no dia 29 de agosto de 1960, Milton Terra Verdi e Antônio Augusto Gonçalves planejavam fazer mais um pouso para abastecer antes de chegarem ao destino final, a cidade de Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. 
Mas, após quase quatro horas de voo, desorientados, a única coisa que os dois viram em meio à floresta sem fim, foi uma pequena clareira, já no território boliviano. Quando as rodas tocaram o solo, eles não imaginavam que ali viveriam seus últimos dias.
Às 17h15, quando pousaram na clareira, Milton e Antonio sabiam que a situação era grave. Quando o motor foi desligado, restavam apenas os sons da selva naquele dia que começava a escurecer. Em um pedaço de papel, Milton fez a primeira anotação:
 “Segunda-feira – Aterrissamos nesta vargem do dia 29/8/60, estamos com gasolina para somente 5 minutos de voo, há uma hora que procurávamos um lugar para descer, pois tínhamos conosco um galão de 20 litros de gasolina, passamos maus momentos pois a gasolina estava no fim, e só víamos mato fechado. Avistamos esta vargem, como se fosse um milagre de Deus. Descemos bem e estamos tomados de um cansaço geral logo escureceu, após termos feito um reconhecimento do terreno, tínhamos duas coisas em mente, nossa família e a possibilidade de decolarmos no dia seguinte”. 
No oitavo dia, tomado pelo desespero pela sede, Augusto toma uma garrafa do combustível do avião. “Terça-feira, 6/9/60 – Dormimos mais ou menos. Sonhei muito com água esta noite. Estamos muito fracos e o dia de hoje promete fazer muito calor. Já tentei tomar urina, mas não foi possível. Tem um sabor de sal-amargo (...) O Augusto se desesperou e tomou uma garrafa de gasolina como se fosse água. Passou muito mal a noite”, escreveu Milton.
No dia seguinte, 7 de setembro, Augusto não resistiu e morreu. A partir dali, Milton passaria quase dois meses isolado. Nos períodos de chuvas, ele conseguia armazenar água e tentava encontrar algum alimento.
Entre várias anotações, Milton descrevia a saudade da esposa e dos filhos e já estava bastante debilitado. Seu último relato ocorreu no dia 6 de novembro. “Hoje faz 70 dias que sofro aqui, minhas forças se acabaram por completo, minhas carnes e minhas reservas de energia se esgotaram e minha pele está ficando roxa, creio que está chegando o fim, lutei e sofri muito para resistir, mas tudo tem seu dia”.
128 DIAS DEPOIS
A família Verdi começou a se preocupar com a demora do retorno de Milton e Antonio e, temendo o pior, o pai Manoel de Oliveira Verdi (o Neca Verdi) procura a polícia para notificar o desaparecimento dos rapazes no final de setembro. 
Não tardou para que o desaparecimento de ambos fosse notícia na imprensa. E aos poucos, o caso de “Milton Terra Verdi” ia tomando conta da região, e cada vez mais mistério e perguntas eram lançados ao ar, ao ponto que o desaparecimento dos dois também já era noticiado em países vizinhos, e logo, no mundo todo.
Somente em dezembro, um avião da FAB que fazia buscas por outro avião da Força Aérea, que havia caído no Peru, passou por cima da clareira, e localizou o pequeno Cessna, isso no início de dezembro, três meses depois do pouso. 
O resgate dos corpos ocorreu somente no dia 2 de janeiro de 1961 quando as equipes conseguiram pousar na clareira. Augusto já estava em avançado estado de decomposição e Milton estava deitado no interior do avião. Walter Dias, primo de Neca Verdi, acompanhou a retirada dos corpos, encontrou as anotações, que mais tarde viraram livro “Diário da Morte” que ainda pode ser encontrado em livrarias pela internet. 
No dia 4 de janeiro de 1961, às 16h, o Douglas C-47 da Força Aérea Brasileira pousava em Rio Preto. Após 128 dias, Augusto e Milton retornavam para Rio Preto, onde foram sepultados lado a lado no Cemitério da Vila Ercília.
O acidente, além de livro, lançado em 1961, também é lembrado em um trecho da canção ‘Rio Preto de Luto’, de Tião Carreiro e Pardinho.  
PEÇA DE MUSEU
Em 2010, o Museu “Asas de Um Sonho”, com autorização da família, resgatou o pequeno Cessna 140 intacto e o levou até São Carlos. A aeronave ficou em exposição, exatamente como foi encontrada. Ao lado do pequeno avião foi montada uma fonte d’água com a imagem de Milton. Hoje, o avião de Milton está no “Museu da Aviação da TAM”, localizado em São Carlos.  

O destino voltaria a abalar a família Verdi com outra tragédia aérea em 2009 que matou o empresário de Fernandópolis Raimundo Verdi de Macedo, a tia dele Mirian Terra Verdi e o piloto Darbyjone Ferro. Raimundo tinha ido visitar a mãe Miltes (irmã de Milton e de Mirian e viúva de Antônio Augusto Gonçalves) em São José dos Campos. No retorno, ocorreu o acidente. O avião, também um monomotor, de propriedade do empresário, caiu em meio a mata fechada e de difícil acesso entre Santa Isabel e Igaratá. “Esse acidente reabriu uma ferida muito dolorosa em nossa família”. Assim Manoel Terra Verdi, definiu na época o acidente que matou sua irmã Mirian Terra Verdi, 69 anos, e o sobrinho Raimundo Verdi Macedo, 44 anos.