Saúde

Advogada alerta sobre os impactos do Rol Taxativo da ANS no tratamento dos pacientes com câncer



Advogada alerta sobre os impactos do Rol Taxativo da ANS no tratamento dos pacientes com câncer

A advogada Natália Scalabrini, fundadora do Instituto de Ensino Câncer Direitos, a primeira escola do Brasil a proporcionar conscientização sobre os direitos dos pacientes com câncer, prestou esclarecimentos sobre o impacto do Rol Taxativo da ANS – Agência Nacional de Saúde – no tratamento dos pacientes com câncer. 
Natália já contou sua história em entrevista ao CIDADÃO. Ela enfrentava um complexo tratamento de câncer de mama, presenciando na pele o que a falta de informação sobre os direitos pode causar na vida dos pacientes com câncer. “Não era apenas sobre regras e leis, era sobre a vida de uma pessoa em seu momento de maior vulnerabilidade”. As negativas abusivas ocasionavam atrasos nos diagnósticos e nos tratamentos, trazendo pioras significativas, por vezes, irreparáveis, no quadro de saúde de muitos pacientes. Isso fez com que ela nunca mais quisesse presenciar isso de novo na sua vida. Aos 28 anos, fundou o Instituto de Ensino Câncer Direitos. “Conhecer os seus direitos te proporciona uma vida mais digna” e esta é a nossa missão na @CancerDireitos. Agora ela traz esclarecimentos sobre o impacto do rol taxativo da ANS no tratamento de pacientes com câncer:
1) Como a decisão do STJ sobre a taxatividade do Rol da ANS impacta a vida dos pacientes que fazem tratamento contra o câncer? 
O impacto da recém decisão proferida pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça é devastador para a comunidade oncológica. Sabemos que a conduta já adotada pelas operadoras de planos de saúde era no sentido de negar, em sua maioria, os medicamentos e os procedimentos alheios ao Rol da ANS. A grande chave, no entanto, é que os pacientes usuários de planos de saúde ainda tinham vastas chances de ter acesso a eles através do Poder Judiciário. Isto acontecia porque o Poder Judiciário mantinha entendimento maciço de que o Rol da ANS era meramente exemplificativo. A consequência deste entendimento era de que não cabia ao plano de saúde definir quais seriam os tratamentos terapêuticos necessários ao restabelecimento da saúde do seu beneficiário. Desta forma, de acordo com o Judiciário, a escolha do tratamento competia apenas e tão somente ao médico que assistia ao paciente, e não ao plano de saúde. Como dito, o posicionamento do Poder Judiciário era firme neste sentido. Tanto assim que o Tribunal de Justiça de São Paulo editou as Súmulas 95 e 102 que excluía a divergência sobre a matéria. Veja: Súmula 95 TJSP: Havendo expressa indicação médica, não prevalece a negativa de cobertura do custeio ou fornecimento de medicamentos associados a tratamento quimioterápico Súmula 102 TJSP: Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS. Agora o cenário é outro! Com a recente decisão do STJ, os planos de saúde negarão, com ainda mais conforto, os pedidos de tratamentos fora do Rol da ANS e, ao buscar o Judiciário, o paciente certamente terá suas chances reduzidas no que se refere ao acesso desses tratamentos. Isto porque, o entendimento do Judiciário que antes era irrefutável no sentido do Rol exemplificativo, inclusive com Súmulas orientativas a respeito, poderá agora seguir ambos os entendimentos – exemplificativo, como já vinham entendendo ou taxativo, com fundamento no novo entendimento do STJ - a depender da convicção do magistrado que aprecie o caso. Neste sentido é que a decisão do STJ é preocupante, pois vai impactar todos os usuários de planos de saúde, sobre maneira os pacientes que fazem tratamento contra o câncer, para os quais, grande parte do tratamento mais avançado e inovador ainda não foi incorporado ao Rol da ANS. É importante esclarecer que, até o presente momento, a questão não foi afetada com repercussão geral. Deste modo, a decisão do STJ não tem caráter vinculante, ou seja, não vai implicar na obrigatoriedade de reprodução do referido entendimento aos demais casos que tramitem perante o Poder Judiciário, e também não tem eficácia contra todos, com a alteração de todos os casos que envolvem a mesma questão de forma automática. Contudo, a decisão poderá servir como um poderoso precedente para que demais demandas que transcorram no Poder Judiciário sejam negadas com fundamento neste entendimento. Um verdadeiro retrocesso ao direito fundamental à saúde.
2) O que os pacientes que tenham terapias negadas pelos planos de saúde podem fazer?
Para os pacientes que se depararem com recusa ou cessação no fornecimento de algum medicamento ou tratamento, sob o fundamento de não estarem contemplados no Rol da ANS, existem duas possibilidades. A primeira delas é solicitar, junto à operadora do plano de saúde, a contratação de uma cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura do procedimento pretendido que esteja fora do Rol. A segunda delas é levar o caso para discussão perante o Poder Judiciário. Neste caso, porém, devemos considerar a possibilidade do caso ser apreciado com os parâmetros do precedente do STJ. Portanto, a boa técnica jurídica nos atribui o dever de demonstrar os requisitos específicos do caso do paciente-requerente. Assim, o paciente terá que demonstrar que o seu caso trata-se de uma exceção e para isto deverá comprovar alguns requisitos como: (I) não existência ou esgotamento de outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol da ANS; (II) prescrição do tratamento indicado pelo médico assistente; (III) que não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar;  (IV) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (V) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e  (VI) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde.