Crônica

Crônica: Alma gêmea por Eliana Jacob Almeida



Crônica: Alma gêmea por Eliana Jacob Almeida

Desde bem jovens, quando começamos a pensar no amor, temos a ideia de que há uma metade nossa perdida por aí e que devemos encontrá-la para sermos felizes. Essa história vem de longe.
O mito da alma gêmea foi criado por Platão e está na obra O banquete. Mas é o comediógrafo Aristófanes que, tomando a palavra, explica o mito. Nos início dos tempos, os homens eram seres completos, com duas cabeças, quatro braços e quatro pernas. Achando-se muito poderosos, subiram aos céus para desafiarem os deuses, que venceram a batalha. Por castigo, Zeus dividiu os homens em duas partes e, quando caíram na terra, cada um saiu à  procura de sua outra metade. Por isso, temos as expressões “a metade da minha laranja”, “a tampa da minha panela” ou “ minha cara metade”.
Há poucos dias, entretanto, li um artigo do Jairo Marques – articulista da Folha – que me chamou a atenção. Como cadeirante, ele afirma que, quem se casa com alguém portador de uma deficiência qualquer – aos olhos dos outros – é sempre uma alma piedosa, que se aventura a viver também com limitações. E diz que isso é um grande engano; nós nos apaixonamos pela companhia do outro, pelo aconchego, pelo bom humor, enfim, pelos sonhos que sonhamos junto. E continua num raciocínio libertador para aqueles que perseguem de forma angustiada sua alma gêmea. Considera que essa outra metade não precisa ser necessariamente um companheiro ou uma companheira; pode ser um irmão, o pai, um amigo, até mesmo um animal de estimação. E por que não?
Também penso que essa nossa busca se dá pelo entendimento do outro; precisamos de alguém que seja nosso cúmplice em nossas fraquezas, alguém que nos acolha mais e nos julgue menos, que entenda nossos limites e comemore conosco nossas conquistas. Às vezes, se tivermos sorte, isso acontece com quem escolhemos como companheiro para a vida, mas às vezes isso se dá de uma forma mais intensa com um amigo de uma vida inteira ou ainda no diálogo silencioso com nosso cachorro. Quem sabe?
O mais incrível, no entanto, é atingirmos o equilíbrio emocional, tornarmo-nos capazes de preencher todas as nossas lacunas e sermos, nós mesmos, nossa alma gêmea.