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Do canavial para à universidade



Do canavial para à universidade
“Tudo vale a pena se a alma não é pequena”. É nesta frase, de Fernando Pessoa, que a jovem Daiani Franchette Viegas da Cruz, de apenas 21 anos, diz se inspirar todos os dias ao acordar, às 3h50, para fazer almoço para levar para o trabalho, onde entra às 5h15 e não tem hora para chegar em casa. “Posso chegar às quatro, às cinco, às seis... Teve um dia que cheguei em casa às dez horas da noite. Depende, tem dia que o ônibus quebra, ou tem algum acidente na pista e isso gera um grande atraso”, explicou.

“Pego o ônibus às 5h15 em Pedranópolis (cidade onde mora) e vou para a roça, cada época em uma cidade da região. Das 9h00 às 9h10, temos uma pausa para descansar, depois só paramos das 10h00 às 11h30 para almoçar. Só temos mais dez minutinhos para tomar um fôlego às 14h00 e às 15h20 já estamos liberados para ir embora”, contou a jovem.

Daiane trabalha desde janeiro deste ano para a Usina Guarani, nas plantações de cana-de-açúcar da empresa nas cidades da região de Cardoso, Pedranópolis e Tanabi. Carpe, planta, cuida. Só não corta, porque “é trabalho muito pesado para uma mulher”.

Ela trabalha de segunda à sábado e mesmo aos domingos acorda no meio da madrugada para fazer almoço para Marcos, seu marido que também trabalha na roça, nas plantações de cana. Depois ela já vai “cuidar” da casa, para deixar bem arrumada.

A jovem conta que em sua turma de trabalho na roça, a de nº 73 (são várias turmas espalhadas pelas plantações), começaram a trabalhar onze mulheres e que agora, chegando no final da safra, as onze permaneceram. “Já os homens... tiveram muitos que desistiram no meio do ano!”. Em sua turma trabalham seu pai, duas primas, e um irmão. Seu marido labuta em outra frente de trabalho.

Até aqui, a história de Daiane se confundi com a de milhares de pessoas que lutam para sobreviver neste país. A grande diferença é que ela é uma pessoa que sonha muito e mais do que isso, não mede esforços para realiza-los. Daiane se forma no próximo ano no curso noturno de Administração de Empresas, pela Unicastelo. Uma conquista que as estatísticas mostram que poucos conseguem alcançar.

Força de vontade é o que não falta a esta jovem. Ela estuda todos os dias meia hora durante a “folguinha” que tem no horário de almoço e quando está em época de provas, estuda também no ônibus rural e no ônibus que pega para ir à faculdade. “É complicado, porque o tempo é curto, mas sei que o esforço que estou fazendo será recompensado no futuro”, suspirou Daiane. E por falar em futuro, seu plano é crescer profissionalmente dentro da própria usina em que trabalha. Com a expressão firme no olhar, que só os sonhadores possuem, ela diz: “É uma empresa que com certeza abrirá as portas para o meu crescimento profissional, ela oferece muitas oportunidades. Trata-se de uma multinacional e quem sabe um dia posso vir até a trabalhar fora do país!”, diz sorridente.

Dormindo apenas de três a quatro horas por noite, Daiane disse que foi difícil se adaptar com os horários, mas depois “o corpo acostuma”. “O pior cansaço é o psicológico, coisa que não tenho”, afirmou. A única coisa que vem tirando seu sono são os preparativos para a formatura e a temida apresentação do TCC – Trabalho de Conclusão de Curso.

Segundo seus professores (que foram procurados pela reportagem do CIDADÃO), Daiane é uma excelente aluna e nunca foi flagrada dormindo ou cochilando durante as aulas, pelo contrário, é participativa e atenciosa. Segundo a professora Macia Prete, o que mais impressiona em Daiane é que “ela está sempre com um grande sorriso no rosto, alegre e de bem com a vida, mesmo tendo madrugado e trabalhado o dia todo sob o sol escaldante”.

Ao ser perguntada sobre o que lhe desanimava, Daiane respondeu que até hoje não achou algo que lhe fizesse desanimar da vida e deu a receita: “tudo é possível, basta querer”.