Do sonho de operador de caixa de supermercado a Doutor em Química

A única certeza que toda criança tem é que irá escapar de muita coisa, menos da árdua missão de estudar. E como é longa a jornada até chegar ao término do ensino médio! Chega ser até martirizante para quem nunca teve bons relacionamentos com algumas disciplinas que fazem questão de dificultar a vida monótona dos estudantes.
Pior ainda para Renan da Silva Fernandes, hoje com 26 anos, que não gostava de estudar e a única coisa que ele queria ser quando crescesse era operador de caixa de supermercado. O que de certa forma, trazia alívio por ele não ter que encarar os árduos quatros anos de faculdade.
“Estudar nunca foi o meu forte, nunca gostei. Porque achava que era meio chato e principalmente porque não tinha uma visão do que eu queria para o meu futuro. O meu sonho era ser operador de caixa de mercado, então para isso eu não precisaria estudar tanto para exercer essa profissão”, confessou Renan.
Mas como na vida nem tudo é do jeito que o aluno quer, estudar se torna no decorrer do tempo, uma tarefa obrigatória. E, às vezes, a inspiração vem de onde o aluno menos espera.
“É engraçado que em se tratando de maturidade, a gente vai adquirindo conhecimentos com as experiências vividas. Eu tenho como espelho a minha irmã que ganhou vários prêmios por ser uma aluna exemplar”, revelou.

ORIGEM HUMILDE
A irmã, culpada pela guinada na vida estudantil do Renan, é a advogada Estefane da Silva Fernandes, 28 anos, para quem ele distribui gratuitamente elogios e agradecimentos. Filho do carpinteiro Jorge Batista Fernandes e da dona de casa Solange Vieira da Silva Fernandes, a origem humilde da família e a trajetória na escola pública são lembradas pelo menino que sonhava em ser operador de caixa de supermercado e chegou a maturidade para se tornar professor-doutor e pesquisador em Química.
“Chego ao final do ensino médio sem saber o que fazer. Mas observei que eu tinha um desejo pela área de química, então optei por fazer o curso de açúcar e álcool da Etec de Fernandópolis no começo de 2011. Como o meu pai só fez até a quarta série e a minha mãe a oitava, eles nunca comentaram comigo a possibilidade de fazer uma faculdade. Então isso foi muito difícil para chegar ao nível de graduação e pós-graduação”, lembrou. 
Quando, levando em consideração as adversidades pelas quais teve que passar até chegar à posição acadêmica e profissional que ocupa hoje, é difícil de saber qual seria a outra versão da história do Renan, independentemente do excesso ou da escassez de recursos financeiros. Bolsista nos cursos de mestrado e doutorado, ele teve que fazer grandes sacrifícios antes de chegar a esta condição.

ESTUDO E TRABALHO
No sexto mês de curso técnico a tarde e de faculdade de química a noite, Renan participou de um processo seletivo para o programa de Jovem Aprendiz da Usina Noble Bioenergia açúcar e álcool, unidade de Meridiano. E passou.
“Eu trabalhava pela manhã, das sete ao meio dia na usina, depois das 13h às 17h45 fazia técnico em Açúcar e Álcool na Etec de Fernandópolis e a noite viajava para Votuporanga para fazer a faculdade”, explicou.
O percurso não foi guiado por um plano com um cronograma de fases preestabelecidas. Renan fez apenas a sua parte em tudo o que deveria fazer. E isso já foi suficiente para conduzi-lo aos títulos de doutor e de pesquisador. Para tanto, não precisou de muita coisa, apenas olhar um pouco para como se sentia profissionalmente em cada momento de sua vida. Sem levar em consideração o preconceito por vir de escola pública e faculdade particular, ele apenas seguiu cumprindo cada etapa de sua carreira acadêmica, em conformidade com o que realmente deveria ser.
“Terminei a faculdade e pensei que deveria tentar uma área acadêmica pelo fato de não ter gostado tanto da área industrial. Passei no mestrado em primeiro lugar. É engraçado porque a gente vem muito desacreditado. Quando a gente vem de uma escola pública e de uma faculdade particular nos quais nós somos muito subjugados, passar em primeiro lugar na Unesp de Ilha Solteira, é muito fora do normal”, destacou.

DO SONHO A DOUTOR

Os anos seguintes, começava a ser construído o currículo do menino que sonhava ser operador de caixa de supermercado. Para tanto, começa a faculdade em 2011 e conclui em 2013, incluindo o mérito de não ter nenhuma prova substitutiva em seu currículo. Em 2014, inicia o mestrado que conclui em 2016, ano que iniciou o doutorado que concluiu 2020. Para obter cada um desses títulos acadêmicos, teve que defender a tese de mestrado sobre “Desenvolvimento de hidrogéis com potencial aplicação em sistemas de liberação controlada”, sendo que no doutorado defendeu “O desenvolvimento hidrogéis bionanocompositos ativos para aplicação na agricultura e na biomedicina. Teste preliminares de fármacos e pesticidas”. 
Segundo a literatura motivacional, todos os maiores empreendedores do mundo que começaram seus negócios ou carreiras sem recursos, dizem que o ponto de partida de qualquer conquista é o primeiro passo. Do curso técnico em açúcar e álcool da Etec ao doutorado na Unesp de Ilha Solteira, Renan teve que continuar caminhando para chegar aonde está hoje. E como para todos aqueles que nunca deram o primeiro passo há uma desculpa para o fracasso, o professor-doutor e pesquisador em química sabe que o que leva às conquistas pessoais e profissionais são as decisões.
“Essas coisas não interferem quando temos vontade de vencer. Do que eu queria ser que era caixa de supermercado e hoje sou professor e pesquisador, estou no lucro. Mas sofri muito nas etapas de graduação e pós-graduação pelo fato de precisar de tudo aquilo do ensino médio que não dei valor, mas através dessa trajetória demonstra que é possível chegar aonde a gente quer. Basta ter disciplina e força de vontade”, concluiu Renan Fernandes.