Geral

ENCRUZILHADA DA IGREJA



Logo na chegada em Guarulhos, Bento 16 fez questão de ressaltar o significado de sua visita ao Brasil.
Alargou os horizontes de sua viagem, dizendo que veio para abrir em Aparecida a Quinta Conferência Geral do Episcopado da América Latina. Mas relacionou estreitamente este evento maior que o trouxe pela primeira vez a este continente onde reside metade dos católicos do mundo à Igreja do Brasil, assinalando que “este país deverá servir de berço para as propostas eclesiais que, Deus queira, poderão dar um novo vigor e impulso missionário a este continente”. E fez questão de enfatizar: “O Brasil ocupa um lugar muito especial no coração do papa não somente porque nasceu cristão e possui hoje o mais alto número de católicos, mas sobretudo porque é uma nação rica de potencialidades com uma presença eclesial que é motivo de alegria e esperança para toda igreja.”
A referência à Igreja no Brasil, para dizer que a partir dela poderá se desencadear um novo impulso eclesial, tornou-se uma insistência.
No encontro com os jovens, no estádio do Pacaembu, em tom de confidência, contou que foi fruto de um desejo seu que a Conferência latino americana se realizasse no Brasil.
Na missa de canonização de Frei Galvão, o primeiro brasileiro nato a merecer a honra dos altares, enfatizou a influência positiva que este fato poderá suscitar, na esperança de despertar um generoso seguimento do seu exemplo.
E na mensagem dirigida aos bispos, na Catedral da Sé, voltou a insistir na mesma tecla, com estas palavras: “É um grande evento eclesial que se situa no âmbito do esforço missionário que a América Latina deverá propor-se, precisamente a partir daqui, do solo brasileiro. Foi por isso que quis dirigir-me inicialmente a vós, Bispos do Brasil”.
Pois bem, a presença do Papa, aqui no Brasil, e a iminente realização do encontro extraordinário dos bispos em Aparecida, mostra a importância da Igreja da América Latina, em especial a do Brasil, para o conjunto da Igreja Católica no mundo.
A Igreja Católica percebe que aqui se trava o seu futuro, aqui se encontra a encruzilhada de sua história.
É a segunda vez que um pontificado se confronta, no seu início, com a Igreja da América Latina, e a partir dela define seu programa.
Em janeiro de 1979 João Paulo II fez sua primeira viagem ao México, por ocasião da Conferência de Puebla. Foi então que ele se deu conta do impacto de suas visitas. A partir daí fez do seu pontificado um roteiro de viagens. Ele tentou fortalecer a catolicidade pela via do arrebatamento entusiasta de sua forte personalidade.
Agora a história se repete. A primeira viagem de Bento 16 fora da Europa é esta, para a América Latina, e de novo a propósito de uma Conferência Geral do seu episcopado.
A Igreja da América Latina tem uma grande contribuição a dar para a catolicidade, contanto que seja entendida e valorizada, sobretudo na dimensão de inculturação, e de descentralização.
Nossa Igreja é herdeira da Europa. Ao mesmo tempo, ela construiu uma identidade distinta e assumiu um rosto próprio. Aí está sua preciosidade. Pode servir de exemplo para a fé cristã se inculturar também em outros continentes, coisa que não aconteceu até hoje.
Por outro lado, em meio à pluralidade cultural hoje existente, a Igreja Católica precisa conciliar unidade com diversidade. Caso contrário, ela continuará perdendo espaço, não acolhendo de si própria outras expressões eclesiais, com o risco de perder também sua missão primordial, de expressar a comunhão universal, justo no momento em que a globalização sinaliza para a urgência de uma unidade integradora das legítimas diversidades.
A insistência do Papa em colocar o Brasil como ponto de partida para esta empreitada, confere novo significado à canonização do Frei Galvão, o primeiro santo brasileiro. Significou também a canonização da rica caminhada da Igreja do Brasil, na esperança de que ela aponte os caminhos para a reconciliação da fé cristã com a modernidade.