Um dos presidentes da Expo Fernandópolis mais respeitados da história, José Sabino Neto, ex-vereador, esteve à frente da festa nos anos de 1980, 1983 e 1986. No observatório de nossa edição especial ele abre o jogo e fala sobre as dificuldades da época em que se fazia a Exposição com portões abertos, as brigas políticas e analisa os moldes da festa atual. Para ele a festa perdeu sua identidade e critica a exclusividade na venda de bebidas dentro do recinto. “Não existe concorrência e isso é ruim para o povo”.
O senhor sempre foi um homem ligado à agropecuária. Como ocorreu o interesse pela política? O ex prefeito Percy Waldir Semeghini teve influência na decisão?
O Dr. Percy Semeghini era candidato a prefeito na época e ele era meu vizinho. Nós sempre fomos amigos e então ele me convidou para ser vereador e eu aceitei, afinal de contas já ajudava ele indiretamente na política, inclusive participei da comissão que realizou a primeira Expo, em 1968
Quantos votos o senhor teve quando foi eleito vereador pela primeira vez? Quantos mandatos foram? Chegou à presidência?
Isso foi em 1980 e foram aproximadamente 430 votos (população era de aproximadamente 50 mil habitantes). Fiquei apenas um mandato e naquela época com a transição de partidos em virtude da vinda da democracia o mandato foi prorrogado por mais um ano, totalizando cinco anos como vereador, mas nunca fui presidente da Câmara.
O que mais te orgulha ter feito como vereador?
A homenagem que fiz para o Dr. Fernando Jacob quando lhe presenteei com a medalha de honra ao mérito
Qual a grande conquista à época e quem era o prefeito quando foi vereador?
Neste período em que fui vereador nós conseguimos o primeiro Parque Industrial de Fernandópolis que existe até hoje. O único aliás. O prefeito Milton Edgard Leão enviou o projeto da criação do Parque à Câmara e nós não queríamos que fosse no lugar onde é hoje por ser uma baixada. Queríamos próximo à rodovia, num lugar mais alto, mas o prefeito insistiu que fosse ali e não teve jeito, tivemos que aprovar ali. A intenção era que fosse à beira da pista, sentido Meridiano, para que ficasse mais a vista, mais diferenciado.
Como analisa as brigas políticas da época e qual a principal delas?
A briga era sempre prefeito com ex prefeito. Brigas internas que atrapalharam muito Fernandópolis. Primeiro era Ademar Monteiro Pacheco e Edson Rolin que brigavam com o Percy (Semeghini). Depois na minha época de vereador a briga era entre o Milton (Leão) e o Percy. Mas não era uma briga ferrenha. A maioria dos vereadores eram de oposição pois estávamos do lado do Percy, mas era uma oposição sadia, não procurava atrapalhar. Quando era projeto bom nós aprovávamos. Alguns vereadores diziam: ‘o Milton Leão foi lá em casa’, ai eu dizia: ‘como é que na minha não vai? (risos)’, porque se o projeto for bom eu iria aprovar de qualquer forma, já se ele fosse fajuto não.
Você foi presidente da Expô em três edições (80, 83 e 86). Na primeira você era adversário do prefeito Milton Edgar Leão. Como foi essa nomeação?
Em 1980, primeira vez em que presidi a festa eu era vereador de oposição do Milton (Leão, prefeito). No dia eu nem estava aqui, estava em no Mato Grosso e os vereadores me escolheram e, como era a maioria, falaram com o prefeito, que queriam que me colocassem. Ai quando cheguei fiquei sabendo e logo já avisei que queria ter uma audiência com o Milton. Ele me chamou e eu fiz a seguinte reivindicação para aceitar a presidência: ‘Não quero que faça política lá dentro’. Naquela época, geralmente vinha deputados e senadores e se não fossem do lado do prefeito não deixavam subir no palanque, discursar e acabava queimando os caras. Por isso eu avisei que não faria política alguma. Qualquer político que viesse teria tratamento igual. Aí ele aceitou, e quando terminou a festa ele veio me agradecer e elogiar por ter ocorrido tudo muito bem e por eu não ter prejudicado ele.
Já em 83 e 86 o prefeito era Nilton Camargo. O que o fez aceitar ser presidente por mais duas vezes? Foi sua amizade com ele?
Eu o apoiei para prefeito e nós tínhamos muita amizade. Inclusive ele queria que eu fosse presidente em 1987 também, mas eu não quis. Disse para deixar para os mais jovens. Vieram aqui, imploraram, mas eu não aceitei. Já das outras vezes eu topei porque minha vontade era apenas de ajudar, faz a festa crescer. Tentei sempre corrigir as falhas da festa anterior e com o Nilton (Camargo, prefeito) do lado era bem mais fácil.
Como era administrar a festa quando não se cobrava ingressos?
Esse aí é o ponto difícil para o presidente era esse. Você não tinha um tostão para tocar a expo. Nós precisávamos nos virar, arrumar colaboradores e era tudo muito difícil. Viajava a São Paulo para ver se conseguia algo com as secretarias, mas se acaso faltasse dinheiro a Prefeitura cobria, mas graças a Deus os três anos em que fui presidente nunca precisamos utilizar dinheiro público. Pelo contrário, ainda sobrava um pouquinho.
O fato de ser agropecuarista ajudava a conseguir parceiros?
Ajudava, mas o que contava muito era a honestidade. Fazia com honestidade para sair bem feito, sem interesse sem levar vantagem em nada. Até porque não se cobrava para entrar. Hoje já cobra a entrada então só àquela renda já ajudava. Inclusive era muito difícil montar agenda de shows, rodeio, pois você nunca sabia se teria verba ou não. Era uma aposta. Agora já dá para começar a planejar antes de começar a festa, mas mesmo daquela maneira sempre deu certo.
Como era a renda com financiamento do gado? Isso que mantinha a Expo?
O dinheiro grosso vinha do financiamento, pois naquela época, estava começando a entrar o leite na região e, foi aí que convidei produtores de todo estado e trouxeram muito gado. Naquele tempo o banco montava um estande lá na exposição, era o Banco do Brasil, banco do estado. Vinha uma verba para os bancos exclusivamente para exposição. Aí a pessoa comprava o gado e já financiava já no recinto. Como estava começando a expandir a produção de leite na região todo gado que vinha era vendido. E a exposição tinha uma porcentagem em cada transação. Alí onde é o estande que fica os carros ficavam os vários currais que nós fizemos. E era o que sustentava a exposição.
Naquela época quais eram as principais atrações da festa?
O diferencial maior sempre foram os shows e o rodeio. Quando nós pegamos não tinha festa de peão na região, por isso era novidade e dava certo. Mas eu cheguei a trazer a Esquadrilha da Fumaça em 1983.
Os agropecuarista eram quem ajudavam na premiação do rodeio?
Sim. Até me lembro de uma passagem, sobre o Cláudio Rodante que era presidente do frigorífico da cidade. Ele sempre dava o primeiro prêmio que era um fusca. Mas como a Câmara não aprovou o projeto que alteraria o nome da Avenida Expedicionários (Brasileiros) ele cancelou o prêmio. Aí eu procurei o Vadão (Gomes) que estava começando em Estrela d’Oeste e ele deu o prêmio. Isso foi o pontapé inicial da trajetória política dele. Depois o Cláudio me procurou e disse que se eu fosse presidente novamente ele queria ser o patrocinador do primeiro prêmio de novo. Quis voltar atrás depois disso.
A partir deste ano a expo passa a ser administrada pela iniciativa privada, via concessão. O senhor está de acordo?
Aí depende de dois modos de pensar. Se o Gutinho pensar somente na exposição, em progredir, pensar na cidade é um bom negócio. Agora pensar apenas em tirar proveito terá sido um mau negócio. O tempo que vai dizer. Um outro ponto positivo é que o recinto não ficará abandonado e que já era minha intenção na época. Mas não dava muito certo.
Se fosse prefeito hoje em dia, mudaria o modelo atual da festa?
Eu acho que a gestão atual está bem. Veio crescendo e tem que dar prosseguimento. Já deram uma estabilizada. Mas de quando passou a ser cobrado ingresso ficou bem mais fácil administrar.
De 1968 a 1992, dos 16 presidentes da festa, oito deles saíram da Câmara Municipal e atualmente isso não ocorre. Qual sua opinião a partir disso?
Não acredito que tenha que ser assim. Tem que escolher uma pessoa capacitada independente se é vereador ou não. Tem ser alguém do ramo, que entende de exposição, de agropecuária e comércio. Mesmo eu saindo da Câmara eu penso assim, pois eu sempre fui agropecuarista.
Acredita que a festa está em boas mãos?
O negócio dele é boate, atrações musicais. Não tem nada de agropecuarista, mas o tempo é que vai falar. Espero que nos surpreenda. Em 2012 eu não gostei, perdeu muito a identidade. Agora virou comércio. Antes o interesse mesmo era a exposição. Não víamos aquilo coimo fonte de renda. Quando fui presidente não existia esse negócio de exclusividade. Por exemplo, essas bebidas. Tinha um pouco de cada coisa com os preços tabelados. O povo tinha opção. Não pensávamos em ganhar, não tinha preço exagerado e tinha concorrência, não dava para explorar. Você podia escolher o que queria beber.
O que tinha naquela época e não existe mais ou que deveria ser revisto?
Podia ter mais leilões de gado. Mas não tem muito o que mudar não. Tem que procurar melhorar os custos para o povão, afinal a festa sempre foi a festa do povo.
Uma das atitudes de quem está comandando a Expo foi a mudança de nome da pista de rodeios que agora se chama “Arena Crystal”. Este espaço já levou o nome de Luis Ferrarezi e o Recinto chama-se Percy Waldir Semeghini. Em sua visão, este novo nome da arena ofusca as homenagens anteriores?
Acho que sim. Ali quem fez e inventou tudo foi o Percy. Não tinha que mudar mais nada não. É um comércio desnecessário.
O que mais te dá saudade quando o assunto é a Expo de Fernandópolis?
O que eu lembro e fico com saudade era da equipe que foi montada. Hoje em dia, se eu não estou enganado só restei eu vivo. Nós fazíamos tudo por amor, com interesse de ver a festa crescer. Tirávamos do nosso bolso sem achar ruim. Ninguém tinha interesse.
Se pudesse voltar no tempo mudaria algo?
Não. Às vezes penso que no que eu podia ter feito, mas não tinha condições então sei que fiz o que dava para ser feito, e às vezes até além. Se como é hoje, com renda, acho que faria muito mais.
O que espera da festa para este ano?
Eu espero que seja boa. Que melhores cada vez mais. Já foi uma das melhores festas do país e precisa manter, porque se deixar cair para recuperar é difícil. E a festa tem que ser para o povo assim como era quando começou.