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Kosuke Arakaki, 90 anos: uma vida marcada por desafios



Kosuke Arakaki, 90 anos: uma vida marcada por desafios

Setembro está sendo um mês especial para o Grupo Arakaki. A Alcoeste Bionergia, uma das empresas do grupo, foi incluída pela Revista Exame na edição especial “Melhores & Maiores” entre as 400 maiores empresas de agronegócio do Brasil. Neste mês, mais precisamente no dia 27, o empresário Kosuke Arakaki, ou simplesmente Luís Arakaki, vai completar 90 anos de idade. O Grupo Arakaki é fruto de um sonho do rapazote que ajudava os pais, Nahi e Koei Arakaki em Catanduva, onde nasceu, mas não queria essa vida. Queria ir mais longe. Aos 18 anos, foi para a cidade aprender uma profissão. Virou mecânico e resolveu investir em seu próprio negócio. Com uma trouxa de roupa e uma caixa de ferramenta chegou em Fernandópolis em 1952. Aqui, começou a vida, casou-se com dona Angelina e teve seus filhos (Luisinho e Mariângela). Em Fernandópolis venceu desafios e construiu um grupo empresarial que gera cerca de 1.300 empregos diretos. O reconhecimento pela oportunidade que a cidade lhe ofereceu veio em forma de apoio e doação para grandes projetos, como Shopping Center e Unicastelo, hoje Universidade Brasil. Prestes a completar 90 anos, Luís Arakaki nem pensa em pendurar as chuteiras, ainda participa do Conselho de Administração do Grupo e dá conselhos quando necessário. Na segunda-feira, 17, ele recebeu CIDADÃO em sua sala no Centro Administrativo do Grupo Arakaki, na Fazenda Santa Alice. A entrevista a seguir é um mini-roteiro da saga desse empresário que daria um livro.


Mês de setembro com dupla comemoração, a Alcoeste entre as 400 maiores empresas do agronegócio do Brasil e o senhor comemorando 90 anos?
Sim, fico satisfeito porque essa conquista da Alcoeste não é minha, é do grupo. Graças a Deus, temos um pessoal muito competente. Esta é a grande alegria que tenho, de contar com todos. Se tenho esse merecimento é graças aos nossos colaboradores. Eles que fizeram acontecer tudo isso. 
O senhor chega aos 90 anos e não pensa em pendurar as chuteiras, continua em plena atividade?
Pra mim é um privilégio que Deus me dá. Eu fico muito feliz e satisfeito, então só tenho a agradecer o nosso grande Arquiteto do Universo que me deu essa graça. 
O senhor continua participando do dia-a-dia das empresas?
Quando vejo alguma coisa, que na minha mente poderia ser diferente, ser melhor, eu dou conselho, mas não exijo que faça. Sou do conselho de administração e acompanho as coisas, participo de reuniões. Quando me chamam estou aqui. A execução está a cargo do meu filho (Luisinho Arakaki) e do meu sobrinho (Zeca) e dos diretores do grupo. Graças a Deus tenho esse pessoal que é muito firme.
O senhor chegou em Fernandópolis ainda jovem. Por que escolheu vir para cá?
A gente tinha na mente que precisava fazer alguma coisa na vida. Eu queria enfrentar desafios. Sou filho de imigrante, lavrador e até 18 anos, trabalhei na roça em Catanduva. Era sofrido, porque filho de imigrante, seja qualquer nacionalidade, com certeza, sofreu como nós sofremos. Trabalhei na agricultura ajudando meu pai e não podia ser diferente. Naquele tempo, era tudo braçal, não tinha mecanização agrícola. Era, como costumava brincar, dois burros puxando o arado e o terceiro burro segurando a ferramenta para lavrar a terra. Quando completei 18 anos, era momento de fazer o Exército ou Tiro de Guerra. Optei por fazer o Tiro de Guerra. A gente morava em Catanduva, na zona rural. Falei para o meu pai que queria fazer o Tiro de Guerra e aproveitar para aprender uma profissão. Não estava interessado em ficar na agricultura. O meu pai até perguntou que emprego desejava. Falei que gostaria de aprender mecânica. Tô vendo o senhor sempre lutando com o caminhão, sempre quebrando, gostaria de aprender essa profissão para ver se tenho condição de ter melhora. Meu pai então propôs terminar a colheita e ir todo mundo para a cidade. Em 1948, fomos todos para lá. Arrumei emprego com o senhor José Zantedeschi, ele tinha uma oficina mecânica. Comecei como aprendiz, limpava a oficina, lavava banheiro e recolhia as ferramentas toda tarde. Um belo dia, o seu Zé me chamou e disse que queria falar comigo antes de ir embora. Na hora pensei, o que fiz de errado, vou levar um pito. Mas chegou a tarde e fui falar com ele. Ele me chamava de Luisinho e me avisou que não iria mais fazer o serviço de varrer a oficina, nem recolher ferramenta. “Você vai ajudar o Japurá”, ele disse. Era o melhor mecânico da oficina. Foi onde aprendi a profissão. Como nunca tinha tirado férias, tirei uns dias, para conhecer outras cidades, já tinha na mente a vontade de abrir minha própria oficina. Fui conhecer o norte do Paraná, que estava com movimento muito grande por causa do café. Fui a Londrina e Maringá, mas o que vi lá não era pra mim. Era coisa muito grande e eu era pequeno. Não tinha como enfrentar. Voltando, meu irmão Pedro que já conhecia essa região, vinha dar assistência em motores a diesel geradores de energia, me chamou para vir conhecer Fernandópolis, Votuporanga e Jales. São três cidades que dá para montar oficina sem problemas. Viemos pra cá, gostei e olhando as três cidades, decidimos ficar no meio, exatamente em Fernandópolis. Primeiro passo foi arrumar um local para instalar. Alugamos um barracão vazio, no fundo do antigo Posto Texaco da Avenida 7 (atual Posto 7). Era tudo terra. Quem tomava conta ali era o senhor Aristides, pai do Vilson Vidal. O posto era do tio dele que morava em Votuporanga. Deu tudo certo. No dia 20 de janeiro de 1952, eu e meu irmão Pedro viemos com uma trouxa de roupa e uma caixa de ferramenta para começar a vida em Fernandópolis. Para abrir a oficina a gente precisava de ferramenta maior, precisava de bigorna, de motor para gerar energia para tocar as máquinas. Foi então que fui pela primeira vez para São Paulo, conhecer a cidade e comprar ferramentas. Chegamos aqui e fomos morar no Hotel Primavera que ficava ali na Avenida 7.
A família veio prá cá anos depois?
Sim, depois que conseguimos comprar uma casa na Avenida 3, isso depois de seis anos, todos vieram para Fernandópolis. A casa era de um senhor descendente de japonês que era gerente da Cooperativa de Cotonicultor. Como a cooperativa fechou, ele queria vender para ir embora para São Paulo. Deu condição boa para comprar a casa, porque naquele momento não tinha muita condição de comprar nada. Veio toda a família, meus pais, minhas irmãs, meu irmão José. Aqui só estava eu e o Pedro.
A dona Angelina, onde o senhor a encontrou?
Graças a Deus em Fernandópolis. Ela já estava morando aqui, quando cheguei. Ela também filha de imigrantes, sofredora, trabalhou na roça. Ele veio ali da região de General Salgado e Magda. O pai dela tinha propriedade lá. Em 1950 eles vieram pra cá. Eu vim em 1952. O destino marcou da gente se encontrar aqui em Fernandópolis. Não sei se fui eu quem a encontrou ou se foi ela quem me encontrou.
Essa oficina foi o ponto de partida. Depois veio a revenda de tratores?
Para chegar à revenda de tratores Massey Ferguson, a Arakaki Máquinas que considero como a empresa-mãe de todo o Grupo, foi uma história longa, praticamente 12 anos depois. A oficina que abrimos no Posto da 7, um ano depois transferimos para um barracão onde hoje é o Banco Itaú na Avenida Expedicionários. O dono do posto pediu o salão e tivemos que procurar outro imóvel. Surgiu esse da avenida, onde funcionava a Oficina Delgado, mas o dono queria vender porque estava de mudança para o Paraná. Ele não queria alugar e sim vender. Um ano de Fernandópolis não dava para comprar. Ele chegou a propor um prazo bom e pediu apenas que arrumasse alguém para endossar. Ele até sugeriu que procurasse o prefeito, na época o Dr. Edison Rolim. A gente já consertava máquinas e caminhões da prefeitura e fui avisá-lo que a gente iria embora porque não estava conseguindo alugar um imóvel para transferir a oficina. O Edison Rolim não queria que fosse embora e falou que visse com o dono do prédio o que podia ser feito. O prefeito disse que faria tudo por mim, chegou a se propor endossar para que comprasse o prédio. O dono do imóvel disse depois que não precisava mais do endosso e que confiava em mim. Pediu um adiantamento à vista e o restante pagaria a cada seis meses com dois anos de prazo e gente vai renovando. Arrumei o que tinha e que não era muito. Graças a Deus deu tudo certo, cumpri com o compromisso, sem precisar prorrogar nada. Com seis anos em Fernandópolis já tinha a oficina montada, prédio comprado, comprado uma casa e trazido a família toda, meus pais, meus irmãos para cá. 
A sua vida sempre foi de desafios. Como foi implantar o projeto da Alcoeste? 
Aí já tinha passado muito tempo. Já tinha adquirido propriedade agrícola, tanto que só pude aceitar o desafio da Alcoeste porque tinha propriedade onde está instalada a usina, senão não tinha conseguido. Dei a propriedade em garantia para o Banco do Brasil. Naquele tempo, quando o governo lançou o Proálcool, em 1975, o gerente do Banco do Brasil de Fernandópolis me falou que o governo estava incentivando implantação de usinas de álcool. Não conhecia nada sobre isso e ele sugeriu que fosse a Monte Aprazível onde já tinha uma usina em implantação. Se gostar, vem aqui que a gente cuida do financiamento disse o gerente. Fui lá, na época estava com 50 e poucos anos, achei que era preciso muita coragem. Olhei a usina quase pronta. Era um monstro, equipamentos que nunca tinha visto. Decidi enfrentar o desafio. Voltei ao banco e o gerente me informou que era preciso formar uma sociedade, já que o governo exigia que fosse uma sociedade de agricultores com terra para plantio da cana. Fui procurar na Casa da Agricultura o Menezes (Alfredo) e Marson (Lauro), que se prontificaram a cuidar disso. Era preciso pelo menos 20 agricultores. Ele conseguiu, mas era farmacêutico, médico, advogado, que tinham propriedades mas não tinham conhecimento da agricultura, principalmente cana, que nem eu sabia. 
A pedra fundamental da Usina foi lançada em 26 de setembro de 1980, véspera do seu aniversário?
Realmente, na véspera do meu aniversário. Com muita satisfação quem veio lançar essa pedra fundamental foi o Secretário da Agricultura, Guilherme Afif Domingues, ao lado do prefeito Milton Leão. Me deu essa honra.
Vendo essa empresa hoje entre as 400 maiores do Brasil no agronegócio qual o sentimento?
Eu sempre repito, não fui eu apenas que fez isso. Foi um grupo formado de pessoas capazes. O mérito é do grupo.
Teve um desafio que o senhor não topou, de ser candidato a prefeito de Fernandópolis?
Realmente, isso não está no meu sangue. 
Mas o senhor foi cortejado?
Fui, mas sempre dei um jeito de sair fora. Eu posso estar junto com quem vence a eleição. Venceu a eleição, é nosso prefeito, estou com ele. Nunca fui contra nenhum prefeito.
Com toda sua serenidade, o respeito que o senhor tem como cidadão, como o senhor vê Fernandópolis? 
Eu fico satisfeito, porque participamos de grandes conquistas para a cidade, como o Shopping Center. É muito difícil uma cidade com menos de 100 mil habitantes ter um shopping como temos aqui. Outro empreendimento que fico orgulhoso foi a vinda da Unicastelo (hoje Universidade Brasil) o que fez com que o município de Fernandópolis se destacasse.
Essa ação de doar a área para vinda da Unicastelo foi uma forma de devolver aquilo que a cidade ofereceu ao senhor quando aqui chegou?
Eu sempre pensei, se Fernandópolis crescer, com certeza, nosso empreendimento cresce junto. Fernandópolis sem a Unicastelo não seria o que é hoje. A gente fica muito satisfeito, orgulhoso, de falar que temos aqui Medicina, Odonto, Engenharia, Agronomia, Veterinária e tantos outros cursos. Isso nos deixa honrado, porque prosperou, cresceu...
Qual foi o maior ensinamento dos seus pais que o senhor carrega por toda a vida?
Agradeço meu pai, minha mãe, porque eles sempre ensinaram que fossemos justo, honesto. Isso não custa nada e tem que ter isso sempre na mente. Ele sempre pedia isso, para a gente nunca se esquecer.
Do alto dos seus 90 anos, quando o senhor olha pra trás, vendo todo o trajeto percorrido, qual o sentimento que aflora?
Alegria. Apesar do sofrimento, isso mostrou que eu precisava trabalhar para ter alguma coisa na vida. E isso deu a coragem de enfrentar tudo. Se fosse filho de alguém abastado, com certeza não teria essa preocupação de querer buscar me sobressair. 
O senhor se considera um homem realizado? 
Sinto-me realizado, pela equipe de colaboradores que temos. Sempre agradeço a Deus que me deu a condição de transpor todos os desafios que tive na vida.