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“O farmacêutico do século 21 precisa resgatar às tradições”v



“O farmacêutico do século 21 precisa resgatar às tradições”v

20 de janeiro é o Dia do Farmacêutico. A data homenageia o profissional que é responsável pela promoção da saúde e bem-estar das pessoas e, entre outros, pela promoção do uso racional de medicamentos. Em pleno século 21, na era da informação, o uso racional ainda é um desafio para a classe. É tão sério o assunto que a cidade aprovou lei criando a Semana do Uso Racional de Medicamentos, como forma de orientar a população.  Fernandópolis é hoje sede da Seccional do Conselho Regional de Farmácias que abarca as regiões de Votuporanga, Jales, Fernandópolis e Santa Fé do Sul, onde estão 1,3 mil farmacêuticos. O delegado do CRF em Fernandópolis é Giovanni Carlos de Oliveira, 51 anos. Formado em farmácia pela Universidade Metodista de Piracicaba em 1992, ele também é professor do curso de Farmácia na FEF, além de ser professor e coordenador do curso da Unilin. Nesta entrevista ao CIDADÃO, Giovanni fala das conquistas e diz que outro desafio da classe é resgatar a tradição e promover a assistência farmacêutica. Veja: 


Como você definiria o papel do farmacêutico do século 21?
O farmacêutico do século 21 tem que se inteirar da área farmacêutica como um todo, ter capacidade de gerenciar, liderar, estar ligado às tendências do momento. Acrescentaria uma coisa, que entendo de fundamental importância para a área da profissão farmacêutica, que é promover a assistência farmacêutica, porque percebemos que existe um certo distanciamento dos profissionais e da pessoa atendida. É preciso dar uma efetiva assistência para esse cliente e a gente tem deixado isso um pouco de lado. Temos que voltar as tradições, trabalhar junto com o cliente oferecendo um atendimento que o esclareça na totalidade sobre os procedimentos na área da farmácia. 
Quais são os grandes desafios da profissão nos próximos anos?
É fortalecer cada vez mais a profissão do farmacêutico. Temos que ter isso como meta, resgatar esse farmacêutico, promover o empoderamento desse profissional seja em que área estiver atuando, drogaria, farmácia, análises clínicas, indústria, mostrando o seu verdadeiro papel para a sociedade. 
Qual foi a maior conquista para a categoria nos últimos anos?
A lei 13.021(que transforma a Farmácia em Estabelecimento de Saúde e reitera a obrigatoriedade da presença permanente do farmacêutico nas farmácias) foi importante, assim como o farmacêutico poder trabalhar com a parte estética. Em 2018, nós passamos a trabalhar com as clínicas de vacinação, desde que o farmacêutico se capacite para isso. Tem ainda a possibilidade de trabalhar com suplementos alimentares. Então são ganhos que a profissão tem tido ao longo dos anos e o Conselho Regional de Farmácia de São Paulo é um dos grandes batalhadores para que categoria se fortaleça com uma representatividade maior para a sociedade.
Muitas pessoas ainda tem a figura do farmacêutico como aquele que pode substituir o médico e prescrever medicamentos. Como avalia?
Não vejo que o farmacêutico tenha a pretensão de substituir o médico. O que o farmacêutico pode fazer é substituir alguns medicamentos, o que está na forma da lei. Mas não são todos os medicamentos que o farmacêutico pode estar substituindo. Ele tem que ter a permissão do médico para fazer isso. É uma das coisas que a população confunde, que fique bem claro, é que o farmacêutico pode fazer várias ações no balcão da farmácia em relação a como utilizar um fármaco, entender a posologia, os efeitos adversos, a quantidade do medicamento que deve ser ministrada, as possíveis interações medicamentosas, fazer um acompanhamento farmacoterapêutico efetivo, mas uma coisa que precisa ficar claro para a população é que o farmacêutico nunca poderá fazer um negócio chamado diagnóstico. Ele não tem esse poder, não pode, não deve e não vai acontecer isso. O que fazemos é o acompanhamento farmacoterapêutico.
Quantos farmacêuticos estão hoje atuando na área da Seccional em Fernandópolis? É possível dimensionar?
Hoje temos aproximadamente 120 farmacêuticos atuando em Fernandópolis, entre drogarias, distribuidoras, rede pública, hospitais, farmácias e assim por diante. Na região toda, a área da Seccional de Fernandópolis do CRF – Conselho Regional de Farmácia – que engloba Votuporanga, Jales, Fernandópolis, Santa Fé do Sul e adjacências, temos em torno de 1.300 farmacêuticos.
Fernandópolis tem curso de Farmácia que todos os anos coloca novos profissionais no mercado. Como está o mercado de trabalho para o farmacêutico?
Na verdade, Fernandópolis tem hoje duas faculdades de Farmácia. A FEF que é a primeira, mais tradicional e tem a Universidade Brasil que tem o curso, apesar de não ter tido uma turma de profissionais formados para o mercado. A FEF ainda tem o maior mercado na formação de farmacêuticos de Fernandópolis. O cenário é favorável. Nós tivemos no ano passado um crescimento na área farmacêutica em torno de 13%. O que a gente observa pelo noticiário que o segmento que mais cresceu no país em 2018 foi exatamente a venda de medicamentos seguido pelo de alimentos. Ainda é uma profissão em ascensão em nosso país.
Antes a profissão era dominada pelos homens. A chegada das mulheres tem mudado o perfil da profissão? 
Vejo que sim, porque as mulheres que estão chegando, por serem mais sensíveis, carinhosas, atendem população de maneira diferenciada. Temos as exceções. Já fui mal atendido por mulheres, assim como por homens. Mas, na grande maioria o atendimento feito por mulheres tem um perfil mais cuidador. Foi um grande ganho, as mulheres descobrirem esse nicho mercadológico e fez muito bem para a profissão o aumento de mulheres farmacêuticas no cenário nacional
Você é delegado do Conselho Regional de Farmácia do Estado que tem a Seccional em Fernandópolis. Qual o papel desse órgão? 
Sou delegado regional na Seccional de Fernandópolis há pouco mais de dois anos. É uma grande satisfação assumir esse cargo e gosto muito do que faço. Na verdade, quando eu falo com os profissionais, muita gente pergunta porque assumi esse cargo. No começo foi difícil responder isso, mas hoje falo que é uma forma de devolver para a comunidade aquilo que a profissão me proporcionou. O Conselho é órgão que tem um papel fiscalizatório. Mas, hoje, muito mais que fiscalizatório ele tem um papel orientativo. O CRF tem 30 seccionais pelo Estado, uma delas em Fernandópolis. O CRF cuida de vários aspectos da profissão do farmacêutico que paga suas anuidades e produz uma grande quantidade de cursos de capacitação. É um órgão que está sempre ao lado do farmacêutico, fazendo o que é melhor para o exercício da profissão. 
Vamos falar um pouco de uma preocupação que faz o CRF realizar campanhas contra o costume nacional da automedicação. Em que dimensão você colocaria esse problema?
Eu vejo hoje a automedicação um problema crônico no Brasil e em vários países do mundo. A população tem esse costume de fazer a automedicação pela facilidade de buscar esse medicamento em uma drogaria e pela facilidade e resolutividade do problema em questão. Exemplo, a pessoa está com uma inflamação, chega em qualquer farmácia e compra um anti-inflamatório sem receita médica. Ou seja, você quer resolver o problema, sem saber, na verdade, qual é a causa daquela inflamação. De repente essa inflamação pode estar sendo gerada por uma infecção ou por outras situações piores. Um caso complicadíssimo hoje é a grande utilização dos inibidores da bomba de prótons, o famoso “omeprazol”. Tem pessoas que têm utilização crônica desse medicamento. De repente, pelo simples fato de estar reduzindo a produção de secreção gástrica, para se livrar de um ardor estomacal, pode estar mascarando uma úlcera, um câncer estomacal. É um problema sério. Por isso, a gente batalhou para colocar em Fernandópolis, e o vereador João Pedro colocou um projeto através de nossas conversas na Câmara, para a implantação da Semana do Uso Racional de Medicamentos em Fernandópolis que é uma lei municipal. O objetivo é alertar a população sobre os perigos da automedicação.
No balcão da Farmácia, o consumidor recebe a orientação sobre o risco do uso inadequado de medicamentos?
Infelizmente a resposta é não. Nem todas as farmácias fazem o processo de atenção farmacêutica, de falar sobre os perigos dos fármacos. Grande parte das farmácias tem a visão de vender. Temos algumas drogarias que assumem essa preocupação de orientar o paciente sobre a utilização do medicamento, quanto tempo ele tem que usar, porque não pode passar do tempo, qual o período de tratamento para não entrar num processo de intoxicação, de dependência do fármaco. Essa seria a postura correta do farmacêutico. Só que hoje, o próprio paciente não quer saber de orientação porque ele está com pressa e o fluxo de uma drogaria com movimento alto, não dá tempo do profissional trabalhar nestas questões. O Conselho Regional e o Conselho Federal batalharam para conseguir o consultório farmacêutico dentro das drogarias, onde você tem um ambiente para orientação do cliente. Infelizmente, poucas drogarias tem esse espaço para oferecer esse atendimento.
Para o leitor, que costuma ir a farmácia e comprar analgésico, anti-inflamatório, entre outros, que ele considera inofensivo, o que diria?
Tem que tomar cuidado, buscar informação sobre o medicamento, em que momento ele deve usar, quais os problemas que isso pode gerar. Tô com dor de cabeça e tomo um analgésico. Mas, qual a origem dessa dor de cabeça, pode ser uma enxaqueca simples, mas pode ser algo mais perigoso. Não posso ficar tomando um medicamento de forma indiscriminada. O ideal é buscar o diagnóstico antes de se automedicar e até mesmo buscar tratamentos alternativos.