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O “rei” do café de nossa região



O “rei” do café de nossa região

Nessa segunda-feira, 14, será comemorado o Dia Mundial do Café, o chamado ouro negro dos séculos XVIII e XIX do Brasil. Para falar sobre a bebida mais consumida no mundo, o CIDADÃO convidou o “rei” do café de nossa região, Armando Prato, para falar dos áureos tempos da cultura que movimentou o noroeste paulista economicamente, assim como todo o país. Ao contrário do que diz a famosa música de Tião Carreiro & Pardinho, “Rei do gado”, onde o rei do café é um “almofadinha” que esnoba os demais em um bar de Ribeirão Preto, Armando Prato, que hoje é presidente do Sindicato Rural de Estrela d’ Oeste, é um senhor de grandes posses, mas dono de um jeito simples e cortês. O empresário chegou a ser proprietário de três máquinas de beneficiamento de café: uma em Estrela d’Oeste, onde mora, uma em Fernandópolis e outra em Votuporanga. As três eram responsáveis por grande parte do café que saia de nossa região. Hoje, ele trabalha com culturas bem distintas – piscicultura e gado de corte e leite -, mas guarda lembranças e cerca de 800 pés do fruto, que lhe rendeu grandes conquistas. Além de falar do café e sua época de ouro, Prato fala de sua curta carreira política e sugere aos outros empresários que não entrem nessa carreira. 

Para o senhor, qual foi a fase de ouro do café?

Foi em 1976 e 1977. Agora vou te explicar o porquê.  Esse ano, até dois meses atrás, estava muito parecido com 1964, época em que a cafeicultura vinha de um prejuízo enorme em virtude da forte seca. Esse prejuízo era tão grande que sequer cobria o custo. O custo de produção estava muito acima do valor e nisso a produção de café do Brasil, que era e ainda é o maior produtor do mundo, caiu de 35% a 45%. Isso ocasionou uma alta em quase 50% do preço que estava e passou a dar lucro. Só que isso não ajudava o cafeicultor, pois a maioria deles já havia vendido toda a safra e o preço mínimo do governo era abaixo do custo de produção. Então, essa alta acabou pegando apenas uma pequena parte dos produtores.

Estrela d´Oeste ficou conhecida na região como a capital do café. Quantos produtores o senhor conheceu e quantas máquinas de benefício?

Só em Estrela éramos sete maquinistas. Em mais de 80% do município era plantado café, ou mais. A região era essencialmente café. Não existia frigorífico, nem indústrias, era 100% café. Naquela época se corria muito dinheiro. O café remunerava bem. Para se ter uma noção, na minha época, além de maquinista, eu fui, por quatro anos, o representante do estado de São Paulo junto ao IBC – Instituto Brasileiro do Café – e através da Faesp eu representava os produtores de café do estado. Por isso eu me lembro de dados dessa época em que o Brasil produzia entre 19 e 21 milhões de sacas de café. O consumo mundial dessa época era de 50 milhões de sacas do produto.

Quais os maquinistas mais famosos da época áurea do café na nossa região?

Em Estrela tinha as minhas, Galbiatti e Prato, a Cafeeira Martins, Castilho, Batistute, Samenzati. Em Fernandópolis tinha o Alvizi, a Cooperativa dos Cafeicultores, a Cafeeira Modesto. Em Jales, tinha o Rossafa, João Xingu, Osvaldo Costa & Pupin, e mais alguns outros.

Produzia-se mais café em Estrela, ou aqui, que é territorialmente maior?

Em Estrela produzíamos o dobro, o pessoal de lá era mais arrojado. Nós tínhamos três máquinas, preparávamos café para exportação, então o movimento era muito maior. Toda a região até Santa Fé comprava café daqui. Éramos conhecidos como “Nova York do café”, por que às vezes o preço estava mais caro aqui do que na bolsa de Nova York. Tinha um grupo, aliás, o que me levou também a sair do negócio é que não tinha mercadoria para todo mundo. Como não tinha, o café começou meio que ser leiloado, começou o jogo com a mercadoria. Então, deixou de comprar e vender tendo um lucro razoável.

Como os maquinistas acompanhavam a bolsa de Santos com a precariedade de comunicação da época?

Naquela época, é claro, não existiam os recursos que temos hoje. No começo de 1973, usávamos rádio amador. Antigamente também tinha o “telefoninho de rodar”. Mas a gente ficava dois ou três dias sem se falar por ele. Era mais o radinho mesmo, ficávamos 24 horas com o ouvido colado nele.

Que importância teve nessa época a ferrovia?

Muita. Nós, por exemplo, tínhamos um local de estocar precário, mas a ferrovia tinha as estações e os armazéns. Coincidentemente, a minha firma ficava 200 metros da ferrovia. Então a gente usava aquilo como depósito. Depois foi chegando um ponto em que começou a demorar muito para fazer as entregas pela ferrovia. Demorava até 15 dias. No caminhão, era em 48 horas.

Como o senhor driblava os altos e baixos do café, já que muitos produtores dormiam pobres e amanheciam ricos, e inversamente também?

Não tem segredo. Era um jogo, e chegou um ponto em que o jogo estava muito arriscado. Você tinha o estoque, e esperava três ou quatro meses esperando para gear, de repente não geava, perdíamos muito, pois se pagava mais do que valia. Era uma roleta. Se imaginássemos que iria gear daqui uma semana, comprávamos bastante e estocávamos. Naquela época tinha o preço mínimo de garantia, então dentro do preço mínimo se pagava o máximo, se perdesse perdia pouco e se ganhasse, ganhava muito. Porém, caso não acontecesse a geada, como esperado, tinha que se vender a mercadoria, o que levou em 1988, quase que 80% dos maquinistas a falência. Dessa de amanhecer pobre eu já passei umas duas vezes e amanhecer um pouco melhor de vida aconteceu várias vezes, tanto é que eu não tinha nada, comecei do zero e se hoje tenho alguma coisa é por causa do café. Os que continuaram jogando, continuaram perdendo. 

O senhor ganhou muito dinheiro com o café?

Não vou dizer que não. Eu ganhei muito dinheiro. Assim como muitos também ganharam. O café deu dinheiro para muita gente, tomou às vezes,  mas deu mais do que tomou. Quem soube sair no tempo certo levou menos prejuízo, ou seja, eu fui um dos que perderam menos.

A erradicação dos cafezais se deu por qual motivo?

O governo tomou uma atitude na época do Delfim Netto, que foi a seguinte: aqui nós temos um clima e uma altitude não favorável para o cultivo do café. E às vezes uma safra dava muito café, e consequentemente muito dinheiro, e passava outros dois anos sem produzir café. Mas, houve um projeto do governo, em que determinadas regiões que produziam café, mas que não tinham climas favoráveis seriam pagas pelo governo para cessar a produção e erradicar o café, isso por vários motivos. Na época foi uma medida polêmica, ficamos chateados, mas infelizmente foi o certo a se fazer. As áreas que foram financiadas (beneficiadas) pelo governo para o plantio foram algumas de Minas Gerais.

O senhor foi muito feliz nos negócios. E na política?

Também. Sempre tive bons amigos, sempre me posicionei de um lado, nunca fiquei em cima do muro. Mas n esse ramo eu já “pendurei as chuteiras” faz tempo.

Que conselhos o senhor daria a um empresário bem sucedido, com vontade de entrar na política?

Acho que não deve entrar, de jeito nenhum. Vou te dar um exemplo atual. Acho que não tem um empresário mais honesto na região como o prefeito de Votuporanga. Na reeleição teve 95% dos votos, o que é um fato muito incrível. E por mais que ele faça muito, sempre se esforçando, tem sempre gente no pé dele, obrigando ele a responder por coisas que não deveria. Outro exemplo mais antigo é do meu cunhado, mas enfim, também poderia citar outros exemplos de Fernandópolis, de Jales, etc. Definitivamente, indico não entrar. Mas tem um contraponto: se os bons não entram na política, entram os ruins.