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Ocupação irregular de calçadas incomoda pedestres



Ocupação irregular de calçadas incomoda pedestres
Paris, final dos anos 40. A chegada da primavera faz renascer a “Cidade Luz”. A capital francesa, que havia sido devastada pela Segunda Guerra poucos anos antes, floresce em alarido humano. Os cafés parisienses são tomados pelos “habituès”. Pessoas como o filósofo Jean-Paul Sartre e a escritora Simone de Beauvoir discutem o existencialismo, modismo do pós-guerra, nas pequenas mesas perfiladas nas calçadas.

Essa imagem rendeu dezenas de filmes para Hollywood e para o próprio cinema francês. Contudo, a ocupação das calçadas por mesas de bares e lanchonetes não parece sensibilizar os pedestres de Fernandópolis, Brasil, na primeira década do século XXI.

Importantes ruas da cidade têm apresentado, nos últimos anos, um aumento gradativo de estabelecimentos do gênero. Há ainda o fenômeno dos ambulantes, que dispõem mesinhas nas calçadas e ocupam área dez vezes maior do que o carrinho de lanches.

Na década passada, a prefeitura tentou solucionar parcialmente o problema criando o “Lanchódromo” ao lado do CPP. O lugar chegou a viver bons momentos, mas atualmente está em franca decadência, com apenas três ou quatro ambulantes remanescentes. S., uma comerciante do ramo, credita a crise à proibição do comércio de bebidas alcoólicas no Lanchódromo: “A namorada se contenta com um refrigerante, mas o namorado quer uma lata de cerveja”, explica.

OCUPAÇÃO

Quem passa pelas avenidas Expedicionários Brasileiros, Líbero de Almeida Silvares ou dos Arnaldos freqüentemente tem que deixar a calçada e se arriscar entre os carros, motos e as indefectíveis bicicletas na contramão. Uma moradora da cidade, que pede para ser identificada apenas como Neide, desabafa: “Moro há mais de 40 anos na cidade e nunca vi tamanho descaso. Não são apenas os bares, há comerciantes que expõem seus produtos nas calçadas e nos obrigam a passar pelo meio da rua. Será que eles pagam algum imposto por isso?”, questiona.

Entre os comerciantes que utilizam as calçadas, ninguém quer falar, nem se identificar. A reportagem foi até ameaçada: “Se você fotografar meu estabelecimento, vou te processar”, garantiu um comerciante. Somente o ambulante B. justificou-se dizendo que a margem de lucro na venda de sanduíches é pequena, e as mesas ajudam a aumentar o movimento. “Tenho que tratar da família”, argumentou.

Outro ponto crítico é a feira livre que acontece às quartas-feiras na Avenida Afonso Cáfaro, quando os comerciantes colocam mesinhas nas calçadas para quem quiser degustar os quitutes ali vendidos. Sobra aos pedestres transitar pela rua, que é o caminho usado pelas ambulâncias e veículos da Polícia e dos Bombeiros para chegar à Santa Casa, normalmente em alta velocidade quando socorrem alguém.


VIDRAÇAS EM RISCO

A comerciante Nilde Martins, proprietária da Climacel, loja de aparelhos de ar condicionado situada na Avenida Líbero Silvares, conta que suas vitrines de vidro temperado correm freqüente risco durante a noite, quando os freqüentadores dos bares se excedem no álcool. “Hoje, qualquer comerciante abre uma ‘portinha’ de dois metros por dois e se acha no direito de ocupar a calçada. Nós pagamos impostos e sofremos as conseqüências”, reclamou.

Nilde considera que a situação “passou do limite” e avoca a Lei Orgânica do Município para cobrar das autoridades uma solução para o problema. De fato, o artigo 106 da LOM dispõe, no parágrafo 2º, que “a concessão administrativa de bens públicos de uso comum somente poderá ser outorgada para finalidades escolares, de assistência social ou turística, mediante autorização legislativa”. Isso, evidentemente, afasta a possibilidade de uso comercial das calçadas.

Outro problema enfrentado pelos pedestres é narrado por Geraldo Pachoalini, gerente da Associação Comercial e Industrial de Fernandópolis, a ACIF. Geraldo e sua mulher costumam fazer caminhadas no final da tarde pela Avenida Libero Silvares. Essa prática, porém, a cada dia fica mais difícil, porque as mesas dos bares impedem o trânsito “e os garçons alinda nos olham feio”, contou.

Outro problema é o péssimo hábito de alguns motoristas, freqüentadores desses bares e lanchonetes, de estacionar em frente a guias rebaixadas, impedindo o ir e vir dos proprietários. Esse problema foi sanado por estudantes de uma república da Avenida Expedicionários, que, num misto de desabafo e gaiatice juvenil, afixaram um cartaz com esses dizeres: “Aqui é garagem, c(******)!”.