Marcelo Alvizi é neto do ex-prefeito Leonildo Alvizi. Hoje é um cidadão do mundo. Saiu de Fernandópolis em busca de cultura e de desafios. Depois de 15 anos em Londres, um ano na Índia, agora ele está vivendo há três anos em Dubai nos Emirados Árabes, vivendo a cultura muçulmana. “É uma cidade nova, deslumbrante, interessante e que é o sonho de uma pessoa, do Sheikh Zayed, considerado o pai da nação que morreu em 2004. Lá tudo é superlativo, mas por outro lado, o emirate, o nativo dali, é muito humilde”, relata. Alvizi passou o carnaval em Fernandópolis e recebeu CIDADÃO para uma entrevista. Aos 47 anos, já faz planos para voltar a viver em Fernandópolis e diz que sua intenção é contribuir com o conhecimento. É critico quando fala da região e de Fernandópolis: “Aqui o desenvolvimento é lento, falta ousadia”. E deixa no ar a possibilidade de enveredar pela política seguindo os passos do avô. Veja a entrevista:
Como foi parar em Dubai?
Dubai foi uma oferta de emprego que tive de uma ex-chefe, mas que virou uma grande amiga. A gente trabalhou em Londres (Inglaterra) por quase 15 anos. Ela saiu de Londres para trabalhar em Dubai, acompanhando o marido que trabalha no ramo de petróleo e começou a dar consultoria para uma cadeia de restaurantes que já conhecíamos lá de Londres. Ela precisava de alguém com as minhas qualidades para ajudá-la na implementação dos projetos em que estava trabalhando. Fazia 15 anos que estava em Londres e essa oferta foi uma oportunidade boa porque estava disposto a conhecer mais uma cultura. E por ser uma cultura muçulmana, islâmica, então aceitei. E a oferta era irrecusável financeira e profissionalmente.
Há quanto tempo está em Dubai?
Estou lá há três anos. Cheguei no dia 8 de janeiro de 2015.
Já está adaptado à nova cultura?
Já. A cultura muçulmana é muito interessante. Acho que a mídia traz uma imagem muito negativa do muçulmano, relacionada a terrorismo, a uma religião fundamentalista. Mas, quando se passa a conhecer, a morar no país, você entende que não é bem desse jeito. É um país com bastante regras, leis, mas desde que você aceite a viver dentro dessas regras, vive-se muito bem, com qualidade de vida muito boa.
Dentro desse regramento, o que te incomodou mais?
Na verdade, nenhuma delas me incomodaram. Eu gosto de bebidas e lá você não compra álcool facilmente, tem lugares especiais para poder consumir e tem que ter uma licença para isso. Isso só veio me ajudar porque passei a ter uma vida mais saudável. Londres tinha muito de sair do trabalho e ir para um barzinho e acabava bebendo. Hoje bebo bem menos.
Em Dubai, você trabalha com treinamento de pessoas?
Eu comecei minha carreira com desenvolvimento e treinamento de pessoal. A minha parte é organização estratégica para as pessoas com capacitação dentro da empresa. Quando fui para Dubai, foi para trabalhar numa cadeia de restaurantes, como chefe de departamento para treinamento e desenvolvimento pessoal. O meu trabalho principal era conhecer a estratégia da empresa, o que a faz empresa de sucesso e passar todo esse conhecimento para os funcionários, de diretores até o pessoal de serviços. Tudo para produzir pessoal de qualidade para atender a demanda de crescimento da rede. Fiquei um ano nessa empresa, porque um dos meus objetivos em Dubai era dar uma guinada na minha carreira. Como Dubai oferece uma oportunidade de trabalho maior em hotéis, a minha estratégia era passar de restaurantes para hotéis cinco estrelas e calhou de uma empresa americana me encontrar e me convidar para mudar de ramo. Aceitei e fiquei dois anos trabalhando nesse hotel. Cheguei antes de abrir, fiz todo o projeto de processos e procedimentos do hotel trabalhando com o grupo de diretores. Abrimos o hotel onde ficamos um ano. Agora estou no período de transferência para outra empresa. Mas, o meu trabalho é desenvolvimento pessoal.
Vivendo essa realidade em Dubai, quando você volta para o Brasil, qual é o choque de realidade?
É interessante. Eu sou brasileiro, mas vivo no exterior como italiano. Minha família é italiana e isso facilita cruzar fronteiras com mais rapidez. Mas meu coração é brasileiro, amo essa região. Por isso prezo em trazer desenvolvimento para cá quando posso. Existe um choque cultural muito grande, onde você vê a diferença de alguns valores. Eles prezam muito pela honestidade, pela qualidade de vida, pelas coisas certas. E aqui, nós brasileiros temos muito de querer levar vantagem, cortar cantos e fazer as coisas mais fáceis. Dubai não é perfeito, mas lá existe uma rigidez no compromisso das coisas. Lá não se consegue ser desonesto por muito tempo.
Sempre que você vem para Fernandópolis você procura trazer conhecimentos para sua comunidade. Como tem sido essa relação?
Antes de ir para Dubai, a minha intenção era voltar para cá. Intenção que quero concretizar depois que fizer meu pé de meia e com todos os cursos que pretendo fazer realizados, porque quero estar perto da minha família, principalmente perto do meu pai e da minha mãe. Eu vejo essa região com muito potencial, mas parece que chega um certo ponto o desenvolvimento não chega aqui, as coisas são morosas. Então, a minha intenção é dar um pouquinho de volta do que recebi. Sempre recebi muito carinho aqui. Eu consegui trabalhar na abertura do Shopping, que foi uma experiência especial. Então eu conheço as pessoas. Tenho uma tia que trabalha na Santa Casa e sabendo da dificuldade do hospital, quis oferecer o meu conhecimento na área de desenvolvimento pessoal. Fiz isso também no Orfanato para capacitar as mulheres que trabalham lá. Prá mim é uma troca, a minha intenção é criar uma comunidade de relacionamento, de trocas, que é o início do meu retorno. Quero passar a minha meia idade aqui. Vou fazer 50 anos daqui três anos, quero estar aqui nessa comunidade ajudando a trazer desenvolvimento. Eu acho, por exemplo, que o agroturismo é uma área a ser explorada. Eu tenho experiência na área de hospitalidade e creio que posso ajudar nisso.
Nessa última estada você também deixou sua marca?
Eu fiz um treinamento de vinho, uma degustação e harmonização de vinhos, com a parceria da Casa & Jardim e a Loreto de Jales. O que trouxe foi um material que desenvolvi em Londres, muito mais que em Dubai. Nunca participei de um treinamento de vinho aqui. O que sugeri foi um treinamento de vinhos para pessoas que apreciam a bebida, mas não entendem muito. Escolhi seis vinhos (dois tintos, dois brancos, um espumante e um doce) e de uma maneira bem prática, trabalhamos isso. Fiquei surpreso com a repercussão. Anunciamos num dia, fizermos o treinamento no outro com um grupo de 17 pessoas.
Você saiu de Fernandópolis jovem, está fazendo sua vida no exterior, mas sempre está na cidade. Cada vez que você vem, como encontra a sua cidade?
Eu sinto que o desenvolvimento é bem devagar, um pouco lento. Nunca me envolvi com a política aqui, mas acompanho muito a política externa, que tem uma semelhança. O fato dos políticos não continuarem alguns projetos de outros políticos acaba atrapalhando. Acho que o ego acaba sendo o maior obstáculo para o desenvolvimento da nossa cidade e região. Existiam projetos grandes, legais, mas é muito demorado e não tem sequência. Os políticos não olham para o desenvolvimento da cidade, mas mais para o lado pessoal. Tenho visto com muita tristeza o desenvolvimento que é muito devagar. Veja o Água Viva, sei que tem projetos para acontecer lá, mas está emperrado, não acontece. A ZPE, acho que é um projeto fantástico, que tem capacidade de trazer muito desenvolvimento, mas está no papel há muito tempo, o prazo está terminando e as coisas não andam. É triste de ver. Por outro lado, é um lugar onde tenho imenso prazer de estar e ver como as pessoas tem se reinventado. Eu trabalhei na abertura do Shopping e estive lá e vi que falta uma mentalidade moderna, para atrair um público legal, para estar cheio de eventos, de atividades. Faltam coisas inovadoras para atrair a região. Falta um pouco de coragem, de ser mais audacioso, de fazer as coisas acontecerem aqui.
Você é neto de um ex-prefeito (Leonildo Alvizi) e fala em voltar para Fernandópolis. Já pensou em seguir os passos do avô?
Já pensei, não sei se tenho sangue político na veia, mas tenho uma paixão muito grande pelo desenvolvimento da cidade, do povo, trazer mais qualidade de vida, onde o cidadão não precise ficar preocupado com o que vem na mesa, com a saúde, com filas de postinho, com educação. Nos países que morei, Inglaterra, Índia e Dubai, a grande diferença é que tem um povo com cultura, com conhecimento. Isso é o grande fator para a tomada de decisões de sucesso. Acho que o público não pode se privar de cultura. Eu gostaria de ajudar de uma maneira ou de outra, poder transferir conhecimento. Não sei se necessariamente como político, mas vejo assim, para ser político tem que ter extremos, ou você tem que ser muito honesto e agir com integridade ou então vai jogar o jogo dos políticos. Se eu fosse me envolver (na política), acho que iria trazer muita contenda, porque a integridade é o maior valor do ser humano. Hoje não sei se me envolveria na política. Minha família tem muito trauma de política quando meu avô foi prefeito. Minha mãe, meus tios falam que meu avô saiu quebrado da política, saiu devendo, teve que vender as fazendas que ele tinha, muito diferente de muitos políticos.
Quando você expõe essa questão de integridade e olha para o que está ocorrendo no Brasil, o que espera das eleições deste ano?
O Brasil é visto lá fora como um país de muita corrupção. Acho que estamos no caminho certo com a Lava Jato e as ações para colocar os corruptos na cadeia. Mas isso leva tempo, é uma geração que tem que passar por alguma dificuldade. Temos que investir na juventude e investir na educação porque é isso que vai mudar o curso da história. Precisamos ter conhecimento de mundo para poder colocar as coisas em perspectiva. Se a nossa sociedade jovem tiver acesso à educação e cultura, temos grandes chances, mas nós não deveremos ver essas mudanças. Os filhos dos nossos filhos é que verão isso. O brasileiro tem uma personalidade de muita paciência e de uma memória muito fraca. Fiquei bobo de ver que o Fernando Collor vai sair como candidato a presidente. Como pode as organizações aceitarem uma coisa dessas. O Lula com um monte de processos, se é culpado ou não, mas é a realidade que está aí. Acredito na integridade e no trabalho pesado e vejo que uma pessoa culta toma a decisão certa.