Depois de um ano e meio em casa, os primeiros alunos da Apae – Associação de Pais e Amigos do Excepcionais de Fernandópolis – estão retornando para as atividades presenciais. Um momento desafiador, mas compensado pela alegria do retorno, diz a diretora geral da Apae Daniele Cristina Brambila de Oliveira. Todo o protocolo de segurança está sendo seguido. O retorno paulatino ocorre no mês de setembro, mês dedicado as lutas por inclusão das pessoas portadoras de deficiência intelectual e múltiplas. É o “Setembro Verde”, marcado pela comemoração no dia 21 do Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência. “Esta data, comemorada e lembrada todos os anos, serve para refletir e buscar novos caminhos e como forma de divulgar as lutas por inclusão social das pessoas portadoras de deficiência intelectual e múltipla”, diz a diretora.
Nesta entrevista ao CIDADÃO, Daniele fala do retorno das atividades presenciais na Apae após um ano e meio de pandemia em que os 150 assistidos ficaram em casa e agora precisam reaprender a rotina escolar. A pandemia mostrou também que a população não esqueceu da Apae. “Ela (população) percebeu a importância da entidade na vida dessas crianças neste momento de caos na sociedade. Fortaleceu o espirito de solidariedade, de ajuda, de amor ao próximo”, disse. Leia a entrevista:
Como está sendo a retomada das aulas presenciais na Apae?
É bem desafiador, porque é um momento delicado e a gente preza pela segurança dos alunos para que corra tudo bem, não tenhamos nenhum problema. Isso tudo é compensado pela alegria de tê-los de volta após um ano e meio sem a presença física deles aqui na entidade. Foi um período muito difícil. A gente esteve com eles, mas em processo remoto, internet, vídeos.
Qual o protocolo que a Apae segue para essa volta?
É o mesmo protocolo exigido pela Vigilância. Fazemos aferição de temperatura, uso de álcool em gel, uso de máscara mesmo que a gente tenha uma legislação que dispense o uso, cada um tem que ter sua garrafa de água. Nas salas de aulas, os professores utilizam máscaras, viseiras, luva, para que a gente não corra nenhum risco de contaminação. Eles, como crianças especiais, são de risco mesmo porque a maioria tem deficiência respiratória, pulmonar. Tivemos o cuidado de verificar se todos estão vacinados e toda a cautela para uma volta segura.
São 150 alunos na Apae e a volta ainda é opcional. Houve consulta aos pais?
Isso, voltaram em torno de 50 alunos, cujos pais optaram pela volta as aulas presenciais. Ainda estamos em um processo de adaptação com o transporte e devagar vamos ampliando esse retorno.
"O retorno é bem desafiador, mas compensado pela alegria de tê-los de volta após um ano e meio"
Qual foi a reação dos assistidos que retornaram após um ano e meio reclusos em casa?
É gratificante, eles ficaram muito emocionados de estarem de volta, mas estamos tendo um pouco de dificuldade de colocá-los na rotina novamente. Nesse período ficaram o tempo todo em casa, sem uma rotina como na escola. Agora temos que habituá-los novamente ao processo de habilitação, reabilitação e aulas para que não se perca o que eles já tinham aprendido. Mesmo que a gente tenha todo o atendimento remoto, o presencial é diferente.
Em quanto tempo acredita que terá os 150 alunos de volta?
Esperamos que até no ano que vem todos estejam de volta. Estamos retornando gradativamente conforme os pais estão procurando com interesse de retorno, vamos incluindo no transporte e retornando dependendo da capacidade da sala, para que se cumpra o espaço de 1 metro de distância, um do outro.
Acredita que houve algum prejuízo para esses alunos durante esse período de pandemia?
Nós sempre fizemos todo o atendimento psicológico, social, mas o atendimento educacional quando é remoto não é igual o presencial. A retomada está sendo feita com cuidado necessário para que eles retomem a rotina de antes da pandemia.
As atividades presenciais estão sendo retomadas na plenitude?
Sim, com todos os cuidados. A única atividade presencial que não retornou é da assistente social. Temos uma sala de atividade socioeducativa, mas ainda não foi retomada por que não houve ainda permissão do governo. Estamos com a área da saúde e a área da educação retomadas. Na Apae Rural, os projetos já retornaram há algum tempo com a área da saúde, especialmente a equoterapia.
"Nossos profissionais foram guerreiros e deram conta de não abandoná-los nesse ano e meio"
Como a Apae se organizou a partir do momento que precisou, como as outras escolas, suspender as atividades presenciais?
Foi bem difícil, ninguém se preparou para uma situação como essa. Nós sempre nos preparamos para estar com eles aqui na entidade, porque são deficientes intelectuais e exigem muito mais atenção e repetição no processo de aprendizagem. Foi muito difícil ter que aprender a lidar com atividades remotas e paciência para estar ensinando por vídeos, atividades no computador e celular, que muitas vezes eles não conseguem mexer e a gente depende de um terceiro que, talvez, não tenha a mesma paciência que um profissional habilitado para trabalhar com eles. Nossos profissionais foram guerreiros e deram conta de não abandoná-los nesse ano e meio.
Qual o momento impactante e meio a pandemia?
De tudo isso que já vivemos, o retorno deles à Apae foi um momento emocionante para todos nós e, especialmente para eles. Vê-los de volta, falando de saudade, mostra que conseguimos marcar a vida deles de alguma forma. Foi sensacional esse momento.
Com o passar dos dias, acredita que mais pais buscarão a Apae para o retorno?
Sim, já tivemos pais procurando para o retorno dos filhos, mas como temos um protocolo interno a seguir, vamos aguardando para que o retorno seja gradativo e com segurança. Acredito que no mês de outubro teremos mais crianças retornando.
Esse ano também foi importante para a Apae porque foi o ano do cinquentenário e que não pôde ser comemorado como era planejado...
A comemoração não tem sentido sem a presença dos nossos alunos, porque tudo que fazemos aqui é para eles. Tivemos que realizar a comemoração sem a presença física deles. Mas, eles participaram da live, mandaram vídeos, assistiram e foi muito gratificante. A live do aniversário foi um momento marcante de interação com nossa sociedade. Foi muito bem aceita, teve muitas visualizações, bastante doações. Foi um momento de estarmos pertos, mesmo pela internet. Tivemos que inovar para não deixar a data em branco.
"Que as pessoas possam incluir todos os portadores de deficiência, que vejam eles com os olhos de igualdade"
Quando falamos da Apae, falamos de uma entidade que precisa da ajuda da população para se manter. Nessa pandemia, como ficou essa questão?
Procuramos nos adaptar. A Feira do Doce na praça não aconteceu, mas fizemos os doces, o bolo chapéu de Napoleão e as pessoas puderam vir retirar aqui na Apae. Mas, a população tem nos ajudado muito. As doações através do telemarketing, do PIX e da live, tem sido muito importante. A população não esqueceu da Apae, mesmo nesse momento de pandemia e percebeu a importância da entidade na vida dessas crianças neste momento de caos na sociedade. Fortaleceu o espirito de solidariedade, de ajuda, de amor ao próximo.
O retorno ocorre em um mês especial, o Setembro Verde...
É especial. Estamos voltando sem que nenhum dos nossos usuários tivesse falecido em meio a pandemia. Foi uma grande vitória. Isso foi uma conquista porque eles conseguiram manter o protocolo de segurança e o retorno à Apae neste mês é fantástico.
O que o Setembro Verde sugere de reflexão para toda a sociedade?
Que as pessoas possam incluir todos os portadores de deficiência, que vejam eles com os olhos de igualdade. Que amem essas pessoas, porque eles têm sentimento de amor por todos nós e vejam o quanto eles são maravilhosos, excepcionais. Para comemorar os 50 anos da Apae e o Setembro Verde nós ganhamos 50 árvores da prefeitura para que a gente faça o plantio com ao nossos alunos e que possamos regá-las para que floresçam. E esse é o setembro verde, que marca a chegada da primavera, do Dia da Árvore, como forma de assinalar que uma sociedade acessível e inclusiva tem que ser sustentável em todos os aspectos e florescer.