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“Cuidar da dentição começa no berço”



“Cuidar da dentição começa no berço”

Antes de completar seis meses de vida, a criança nascida em Fernandópolis já pode iniciar o trabalho de prevenção para ter uma boa dentição. Como diz o lema do projeto “Bebê Clínica” que está completando 10 anos: “não é apenas uma boa educação que começa no berço, uma boa dentição também". A odontopediatra responsável pelos atendimentos no Bebê Clínica em Fernandópolis Kátia Esteves Gomes em entrevista à Rádio Difusora e jornal CIDADÃO, explicou detalhes do projeto que funciona no CEO - Centro de Especialidades Odontológicas – disponibilizado gratuitamente pelo município. Logo após o nascimento do bebê, os pais já recebem na Santa Casa ou no exame do pezinho, as informações sobre como chegar ao projeto. O ingresso da criança deve ocorrer até o sexto mês. “As pessoas estranham porque bebê nessa idade nem tem dentinhos, acham que é precoce demais, mas não é. Temos que ter a oportunidade de criar bons hábitos desde pequeno”, diz a dentista. Ela explica que levar a criança desde cedo ao dentista não é excesso de zelo, é uma ação preventiva. “Eu sempre digo que quem livra a criança da cárie não é o odontopediatra, são os pais. A diferença está nas informações e orientações que vamos passar a eles (pais) ”, assinala. Leia a entrevista:

O projeto Bebê Clínica atende o bebê a partir de que idade?

Para ingressar no “Bebê Clínica” a idade máxima é de seis meses. As pessoas estranham porque bebê nessa idade nem tem dentinhos, acham que é precoce demais, mas não é. Temos que ter a oportunidade de criar bons hábitos desde o berço. É também uma oportunidade para observar algumas alterações. Tem crianças que já nascem com dentinhos que são conhecidos como dentes neonatais, crianças que tem o freio lingual curto, o que dificulta ou impede a amamentação. E quanto mais cedo ocorrer o diagnóstico, melhor, a criança já é encaminhada para a dentista que faz a cirurgia e a amamentação é salva e isso é muito valioso.

Como funciona o programa?

Esse é um programa preventivo. O dentista vai atuar muito com orientações e informações aos pais que normalmente ficam sabendo da existência do projeto na Santa Casa ou no teste do pezinho. Temos um cronograma de reuniões de 15 em 15 dias e os pais que tiverem interesse devem ligar no CEO – Centro de Especialidades Odontológicas – se inscreverem para participar de uma única reunião e sairão de lá com o horário agendado para a primeira consulta do bebê. Os pais têm ideia que vão chegar lá na primeira consulta e vamos colocar o bebê na cadeira e não é assim. A primeira consulta no Bebê Clínica demora de 30 a 40 minutos e é 90% conversa e 10% exame clínico da boquinha do bebê. São as orientações passadas aos pais que farão toda a diferença nesta fase. Vamos conversar sobre como foi a gestação da mãe, as intercorrências, porque a gestação tem relação com a formação e algumas alterações nos dentinhos. É uma oportunidade de a mãe expor todas as dúvidas.

"Os primeiros mil dias de vida de uma criança são os mais importantes e determinantes para o resto de sua vida"

Isso tudo é gratuito?

O bebê clinica é um projeto gratuito oferecido pelo município. O que é exigido para se manter no programa? O comprometimento dos pais desde a primeira reunião, primeira consulta e consultas periódicas que serão agendadas. As faltas não justificadas podem resultar no desligamento do projeto, onde a criança entra bebezinha antes de completar seis meses, e permanece no projeto até os 5 anos e 11 meses.

Esse é o período importante da formação da dentição da criança?

Essencial. Os primeiros mil dias de vida de uma criança são os mais importantes e determinantes para o resto de sua vida. Esse período de mil dias vai desde a concepção até os dois anos de vida. É quando os bons hábitos se instalam, como escovação e alimentação. Por exemplo, uma criança que não consome frutas nessa época, dificilmente após os dois anos aceitará a fruta. Então, estamos ali no projeto para trabalhar toda essa gama de fatores que são determinantes para a cárie, que não acontece só por falta de escovação. A alimentação tem um peso muito grande e temos que trabalhar isso com os pais.

"Quem livra os filhos da cárie são os pais, através dos cuidados diários, o básico bem feito todo dia"

O conceito de que na fase do dente de leite não precisa se preocupar é um mito?

Sem dúvida. Trabalhamos muito com essa mentalidade de que levar a criança ao dentista deste cedo é excesso de zelo. Mas, os pais não levam a criança ao pediatra desde os primeiros dias de vida, para saber quanto cresceu, o peso, se está tudo bem? Fazem isso com a mentalidade preventiva. Assim como a criança é acompanhada pelo pediatra, ela também deve ser acompanhada pelo odontopediatra. O dente de leite é temporário e isso é fato. São 20 dentes de leite, todos serão trocados e vão nascer os dentes permanentes no lugar. Mas, se dente de leite está ali na boca é porque tem funções a cumprir até a data da troca. Quais são essas funções? Da estética, da mastigação, da fala. Qualquer problema, vai prejudicar o desenvolvimento da criança. Se o dente de leite foi dado por Deus temos que cuidar dele para que ele cumpra seu papel na cavidade bucal até a data que ele vai cair naturalmente para nascer um permanente no lugar.

Qual a importância de detecção do problema no freio lingual?

Esse problema do freio lingual sempre existiu. O projeto tem essa finalidade também de detectar esse problema nos primeiros dias de vida. É o que chamamos de língua presa, porque esse freio é curto e impede a língua de levantar, de lateralizar livremente. Há relatos bíblicos que mostram que tinha língua presa desde sempre. Muitas vezes, só ia se descobrir a língua presa quando a criança começava a falar. Acredito que hoje, a gente está sendo mais cuidadoso no exame clínico em todas as áreas. Hoje tem o teste da linguinha que já é feito na Santa Casa, com avaliação pela fono. Saem com o selo de que passaram pelo teste da língua. O dentista está com olhar mais atento, porque por um freio curto, a criança não consegue amamentar no peito da mãe e o leite materno é padrão ouro de alimentação. É só liberar essa língua com uma cirurgia simples que a criança vai conseguir mamar tranquilamente. Existem freios que são óbvios, mas existem uns freios que são ditos submucosos que são duvidosos e podem, mesmo com acompanhamento, ocorrer um retardo no diagnóstico.

"O objetivo do projeto Bebê Clínica, é que tenhamos uma geração zero cárie e os cuidados começam desde bebê"

Todas as crianças conseguem ter acesso fácil ao projeto?

Sim, só que o acesso deve ocorrer até os seis meses de idade. Os pais interessados precisam ligar no CEO fazer a inscrição para a reunião e depois seguir o calendário de consultas até os 5 anos e 11 meses. Eu sempre digo que quem livra a criança da cárie não é o odontopediatra, são os pais. A diferença está nas informações e orientações que vamos passar a eles (os pais). Sabemos que todos os pais querem acertar. Quando dá errado e chegam as crianças com cáries gravíssimas, dor de dente, com canal, o que faltou ali não foi amor, faltou foi orientação. Se tivesse tido a oportunidade de ser orientada, aquele quadro poderia ser evitado. Quem livra os filhos da cárie são os pais, através dos cuidados diários, o básico bem feito todo dia fará a diferença. Não será a minha limpeza profissional, não será o flúor que uso no consultório, mas o flúor da pasta de dente todo dia, a mão da mãe fazendo essa escovação quando a criança ainda não tem essa habilidade, é a alimentação desde cedo. A gente vê bebê tomando sorvete, quando a orientação da Organização Mundial da Saúde é de que deve-se evitar o doce, o açúcar, até os dois anos de idade. E isso é muito importante. Mas, os pais acham que uma provadinha não vai dar cárie, mas a questão é o paladar da criança que está sendo formado e que será alterado.

Qual o estado geral da saúde bucal das crianças de Fernandópolis?

Considero bom. Fernandópolis tinha, antigamente, o projeto do dentista trabalhar nas escolas e isso reduziu muito o índice de cárie. Embora o dentista não esteja mais na escola como antes, o trabalho continua sendo feito com muito cuidado. A odontologia tem uma coordenação muito boa com uma equipe muito organizada que vai às escolas periodicamente, ensinar escovação, entregar kits, realizar exame clínico para traçar o perfil epidemiológico da cidade. Os pais das crianças com necessidade de tratamento são orientados para que levem o filho ao dentista. Essa é uma responsabilidade dos pais, não importa se vai procurar o serviço público ou particular.

Quais os problemas mais recorrentes na clínica?

A doença mais prevalente no mundo é a cárie e aqui não é diferente. E a cárie é uma doença dependente de açúcar. Muitas mães dizem que escovam os dentes dos filhos três vezes ao dia. Mas, a alimentação rica em açúcar é um fator muito importante para cárie que é uma doença que podemos prevenir e a criança ser um adulto zero cárie. Esse, aliás, é objetivo do projeto Bebê Clinica, que tenhamos uma geração zero cárie. Quem cuida desde bebê da dentição, quando adulto não vai saber o que é um implante, coroa de porcelana ou dentadura. Quem investe em prevenção terá uma qualidade de vida muito melhor. Tirando a cárie, que é a mais prevalente, a criança está sujeita a doenças como mão-pé-boca, estomatite, sapinho que é a candidíase, ou a traumas quando começa a andar e correr, cair e fraturar o dentinho.

 

 

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