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Dívidas de médio e longo prazos da Prefeitura passam de meio bilhão de reais



Dívidas de médio e longo prazos da Prefeitura passam de meio bilhão de reais
Edson Damasceno em entrevista ao CIDADÃO

O alerta é do economista Edson Ribeiro Damasceno, 64 anos, que também foi secretário de Planejamento por duas gestões 
na Prefeitura de Fernandópolis. O objetivo é mobilizar a sociedade para o problema que tem origem no passado e que, se nada for feito, vai comprometer o futuro. Damasceno realizou estudo que demonstra que o endividamento do Município vem crescendo e vai continuar a ponto de inviabilizar as próximas oito gestões, até 2053. Como prova, ele cita o fato da prefeitura estar se desfazendo de imóveis para cobrir o déficit previdenciário, por falta de recursos. O déficit previdenciário é o problema que salta aos olhos, mas não é o único. O economista fez um estudo comparativo do período entre 2008 e 2018 e verificou que os orçamentos cresceram e os investimentos caíram, contrariando a teoria que seria “crescimento x crescimento”.  A pandemia do coronavírus agrava a situação. Por isso, nesta entrevista 
ao CIDADÃO, Damasceno faz o alerta, não com objetivo de buscar culpados, mas para encontrar solução para que a cidade volte a ter capacidade de investimento. Leia a entrevista:

Você apresenta um estudo, acompanhado de um alerta, que diz respeito ao futuro de Fernandópolis. Do que se trata?
A preocupação com o futuro de Fernandópolis é em função do passado. O estudo que fiz demonstra algumas coisas que a sociedade fernandopolense não tem conhecimento. E ela precisa ter conhecimento, não só para cobrar, mas para sugerir soluções. Essa situação, por muitos anos, ficou nos bastidores. Estamos vivendo um momento, onde a informação, a transparência, tem que prevalecer. Vou expor alguns dados que vão impressionar: o município de Fernandópolis tem um compromisso com dívidas de médio e longo prazo que passa de meio bilhão de reais, isso com base em estudo de 2018. No estudo de 2020, esse número deve crescer, porque historicamente a estatística demonstra que só houve evolução da dívida. Não que Fernandópolis só tenha esse problema estrutural. Tem outros problemas, mas esse é o mais grave, mas, por outro lado, acho que é o que tem solução mais fácil no sentido de colocar a cidade no caminho do desenvolvimento. A gente tem visto ao longo do tempo que nenhuma administração consegue alavancar o município. E tem explicação técnica para isso. Não é porque os gestores não querem que a coisa aconteça. Eles querem. Como não tem conhecimento, o gestor chega e se depara com a situação e se vê impotente diante das coisas. Tomei essa iniciativa para que a população entenda por que o município não cresce, por que as forças políticas não se unem para tentar resolver o problema. Quem está na administração tem lá fora um grupo torcendo para ir mal porque isso vai ser o argumento para ele na próxima eleição. Será que esse modelo ainda funciona? Isso não nos levou a nada até agora. É a política do perde-perde. Tenho 64 anos, 61 anos de Fernandópolis, passei a minha vida profissional na área financeira e, quando me deparei com os problemas da prefeitura eu entendi que precisava descobrir o que estava acontecendo e algumas coisas que consegui decifrar, exige que a sociedade (imprensa, classe política, os três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – associações de classe, clubes de serviço) tome conhecimento. Todos precisam saber da situação, porque alguma coisa precisa ser feita.

É hora da gente puxar para um lado só. Vamos ter 35 anos até 2053, muito difíceis"

Esse endividamento de meio bilhão de reais que você cita, está fundado em quê? 
Ela tem um caráter previdenciário. De 30 a 40 milhões são coisas diferentes. Nesse número estou tratando da dívida de médio e longo prazo. Não entram dívidas de curto prazo. Essa dívida previdenciária está consumindo quase 15 milhões de reais/ano, dinheiro que poderia ser alocado em investimentos para alavancar o desenvolvimento da cidade. Chegou o momento de sentar e fazer um debate construtivo. Não adianta jogar a culpa em alguém, não é hora de saber quem fez isso. O problema está ai e precisa ser resolvido. A gente sabe que as opções do passado de Fernandópolis é que nos trouxeram a esta situação. 
Pode-se dizer que o Instituto de Previdência é o calcanhar de Aquiles da cidade? 
A gente não pode demonizar o Instituto de Previdência, até porque ele não tem culpa. Nós temos outros problemas que mexem com a estrutura do município, mas essa é a mais espinhosa ao meu ver e é a que mais impacta. Mas, nós teríamos que enfrentar uma reforma administrativa, entre outras providências que precisam ser tomadas. Por isso que reputo a importância de todos se sentarem à mesa e discutir os problemas. E colocar na ordem de prioridades. A questão previdenciária é a que salta aos olhos, mas não é a única. 
Recentemente o conselheiro do Tribunal de Contas Dimas Ramalho, em análise das contas do município, chegou a sugerir que Fernandópolis estudasse a viabilidade de repassar o Iprem para o Regime Geral da Previdência. Esse seria o caminho?
Veja bem. A partir do momento que um conselheiro do Tribunal de Contas recomenda esse estudo, ele aponta um caminho. Foi a partir daí que me aprofundei no assunto e vejo que é um caminho. A outra possibilidade que existe penaliza o funcionário público, porque teria que aumentar a cota parte dele para buscar o equilíbrio. A possibilidade de ir para o Regime Geral, não trará prejuízo algum para o funcionalismo. Ele vai continuar com os direitos garantido. Veja que a municipalidade já perdeu a capacidade de pagar a Previdência e passou a direcionar prédios públicos. O recado que passa é: não estou dando conta de pagar. Não se trata de dizer que um ou outro prefeito queria que chegasse a esta situação. Quando resolvi fazer esse estudo foi para mostrar para a sociedade que temos um grande problema que precisa de solução. Todos os prefeitos, por lei, têm que cumprir porque implica em vários problemas (improbidade administrativa, crime de responsabilidade) e o município que não cumpre os pagamentos, perde o Certificado de Regularidade Previdenciária e isso significa que terá repasses cortados, não terá financiamento, não terá liberação de verbas, convênios, etc. É o colapso. Faço esse alerta, porque acho injusto que, não tornando isso público, que pessoas que se candidatam a candidato não saibam dessa situação e vão prometer coisas que não vão poder cumprir. E o eleitor que vai votar, acha que terá suas necessidades atendidas. Isso é estelionato eleitoral. Isso precisa ficar claro para a sociedade. É amargo o remédio que tem que ser ministrado? É amargo, ninguém consegue resolver isso com uma canetada. Não existe recursos a fundo perdido para cobrir isso. Vamos ter que fazer um corte drástico nas despesas.
Esse quadro que você desenha compreende um período de oito gestões pelo menos?
Não é só isso. Estou passando um quadro de 2018 e o estudo é por 35 anos. Então o que acontece? Até 2053 está comprometido. Só que o estudo de 2019 vai jogar para 2054 e assim por diante. Eu citei oito gestões, mas, cada ano que passa vai jogando um ano lá para a frente. Só que o estudo projeta também a vida útil do cidadão que hoje está em 74 anos e que pode ir para 80 daqui a 10 anos. Isso está virando uma bola de neve, uma conta impagável. 

Diante desse quadro temos que pensar em discutir uma candidatura única com projeto amplo de médio e longo prazo

Você fala da união de todos e o prefeito André Pessuto chegou a criar um grupo de trabalho (Conselho da Cidade). Seria o fórum adequado para iniciar esse debate?
Acho que o debate tem que envolver mais setores da sociedade. Temos que envolver o Judiciário nesta questão porque o município está caminhando para a inviabilidade. Os candidatos precisam conhecer o problema. E não só candidatos a prefeito, mas também os candidatos a vereadores precisam saber disso. Digo isso, porque os vereadores de Fernandópolis não têm seus pedidos atendidos, mas não é porque o prefeito não quer. É que não tem como atendê-los. É só somar: gasto com pessoal 60% (A Lei de Responsabilidade Fiscal fala em 60%, porque considera 54% dos servidores da ativa e mais 6% que vai para a Câmara), mais o gasto obrigatório com a Educação 25% e com a Saúde 15%. Já passou 100%. As únicas duas pastas, entre as 18 existentes, que tem condições de trabalhar são Saúde e Educação e com muita penúria. As demais pastas não têm recursos. Quando falo em estelionato eleitoral, é querer vender uma coisa que não existe. O cenário está ai. 
Quando traz isso a público, você quer colocar responsabilidade no debate eleitoral que teremos pela frente? Nada de prometer milagres?
Não é questão de prometer milagres, mas de recuperar a capacidade de investimento do município. Se um deputado mandar uma verba para Fernandópolis de 1 milhão de reais, a prefeitura não tem a contrapartida de 200 mil. Se for um convênio que precisa de contrapartida, o município tem que devolver ou deixar de pagar alguém para cumprir essa obrigação. E tudo isso penaliza o gestor. Acho uma injustiça com a sociedade a gente não demonstrar isso em um ano eleitoral. Não é para queimar ninguém. Isso é para que as pessoas saibam onde vão entrar. Então, o apelo que faço é que todas as forças da cidade sentem-se para viabilizar, e isso é pensamento meu, de uma candidatura única com projeto amplo de médio e longo prazo para o município e com metas pré-estabelecidas. É hora da gente puxar para um lado só. Nós estamos falando em 2020 com um estudo de 2018, mas a gente vai ter 35 anos até 2053, muito difíceis. É bom frisar que esse estudo foi feito antes da pandemia do coronavírus. O cenário agora vai piorar, e muito. A economia mundial vai entrar em uma recessão, o Brasil, o Estado de São Paulo e Fernandópolis, estão dentro desse contexto. No geral, os orçamentos públicos são montados em cima de uma fixação de despesas e uma estimativa de receita. Olha o contraditório: a gente tem uma despesa fixada com uma receita que vai cair por conta da pandemia. Fatalmente vai dar déficit. No nosso caso, a gente já tem um déficit. Nós vamos somar mais déficit. Eu não tenho inimigo, mas não recomendaria a prefeitura de Fernandópolis nem para meu inimigo. Ninguém consegue resolver o problema sozinho. Tem que sentar todos à mesa e fazer um plano de gestão de no mínimo 20 anos para tirar o município dessa arapuca. Se a gente continuar nesse modelo, a cada quatro anos, vai aparecer um salvador da pátria, como sempre apareceu para trabalhar em cima do que está ruim e convencer as pessoas. Temos que andar pra frente. Agora, quando você chama as pessoas para se sentarem à mesa, não pode ter a ressalva de que não podem divergir. A divergência é um alimento da democracia, a divergência chama atenção para coisas que não estamos enxergando. Quando comento com amigos sobre isso que estou dizendo aqui, as pessoas perguntam: Mas, porque é que não fizeram isso ainda? 

Eu não tenho inimigo, mas não recomendaria a prefeitura de Fernandópolis nem para meu inimigo"

O alerta que faz serve para jogar luz nesta discussão sobre o futuro da cidade. É isso que quer?
A proposta é essa. Nós eleitores, votamos e transferimos a responsabilidade para os governantes. Isso ocorre no Brasil inteiro e achamos que eles têm que resolver o nosso problema. Os problemas são comuns a todos, portanto, tem que defender o interesse público. Alguém pode indagar: Esperou chegar nesta situação para vir pedir socorro? É, chegou a hora de socorrer. Todas as consequências disso que estou falando é da sociedade. Uma criança que nascer hoje, estará comprometida pelos próximos 35 anos. Sozinho, nenhum dos candidatos a candidatos, vai conseguir resolver o problema. Isso não tem mágica. Isso é jogo bruto, por isso é necessário que todos se unam e decidam puxar para um lado só. É isso que estou propondo. Estou à disposição de todos. Entendo que o eleitor não pode ir para a urna sem ter essa informação.

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