É o que diz o psicólogo Everson Mandarini Masson ao abordar o movimento “Dia de Doar” comemorado em 29 de novembro. O Dia de Doar faz parte de um movimento para promover a generosidade e a cultura de doação. É uma mobilização que promove um país mais solidário, por meio da conexão de pessoas comcausas. E faz isso celebrando o prazer que é doar, e o hábito de doar o tempo todo.
Segundo o psicólogo, a doação tem que ser um ato incondicional, sem trocas. “Se não for assim, haverá decepção e sofrimento”, completa. Ele ressalta que vivemos dias de egoísmo e individualismo onde as pessoas querem ser detentoras da verdade. Temos que pensar que não podemos medir o outro com a nossa régua. E isso passa pelo respeito ao próximo. Vale para todas as esferas, política, religiosa, ideais, seja lá o que for”, diz. Ele propõe uma reflexão sobre
o olhar para o outro. “Convido as pessoas para a ação, para doação incondicionada. Cuidado ao julgar, condenar, sentenciar o outro porque a vida, às vezes, vai te colocar também naquele lugar”. A entrevista, a seguir, é uma ótima reflexão para este mês de dezembro, com a aproximação do Natal, principalmente após uma política polarizada que separou amigos e dividiu famílias. Leia:
Esta semana vivemos o Dia de Doar. Por que é importante doar e doar-se?
Vivemos dias em que o egoísmo e o individualismo tem sido muito imperativo. Isso nos traz uma nova reflexão sobre o olhar para o outro. Olhar com amor, olhar quebrando todas as barreiras e preconceitos. Mahatma Ghandi falava muito sobre isso, que o mal do ser humano é o egoísmo. Doar-se é entregar-se ao outro ou a uma causa, acima de si próprio. Muitas vezes pensamos que a doação é material, doar uma cesta básica. Isso também é um tipo de doação. Mas, hoje estamos precisando de outra doação, que é a doação de si. Isso deve ser exercitado diariamente em nossas vidas, numa conversa, num olhar, ouvir ou num abraço afetivo. Saber ouvir é diferente de escutar. Ouvir é se interessar pela história do outro, olhar para dentro do outro, despojar de todos os conceitos e preconceitos. E doar-se é um exercício diário.
Qual o benefício da pessoa que pratica a doação?
O ganho é mútuo. Sempre quem doa as flores fica com o perfume nas mãos. Isso me lembra uma frase de Madre Teresa de Calcutá que diz: jamais permita que outro saía da sua presença sem que se sinta melhor. Acredito que os benefícios que você fornece ao outro você recebe de volta. Esse é o verdadeiro sentido da palavra gratidão. A energia recebida tem que ser devolvida. Nunca sabemos quando estaremos do outro lado, precisando.
"Doar-se é entregar-se ao outro ou a uma causa acima de si próprio, sem esperar retorno"
Vivemos tempos difíceis, em meio a uma pandemia e uma eleição polarizada que produziu brigas entre amigos e familiares. Como avalia este momento?
Acho que estamos sendo provados. É momento para cada um, humildemente, refletir. Acho que é essa humildade que está faltando em nós. Queremos sempre ser donos da verdade, mas a verdade quando se torna absoluta ela deixa de ser verdade. O respeito as diferenças, a pluralidade do ser humano. É isso que precisamos repensar.
Quando chegou a pandemia, a palavra “empatia” ganhou força e todos falavam que sairíamos seres humanos melhores. Estamos melhores?
Eu mesmo escrevi um artigo sobre isso. Dizia que a pandemia viria para nos transformar de alguma forma, propor uma nova reflexão diante da vida. Acredito que, infelizmente, estamos falhando enquanto humanidade. Vejo que a tal da empatia, que é colocar-se no lugar do outro, ficou apenas em uma palavrinha bonita colocada no discurso. Empatia não se fala, vive-se. Então, precisamos viver a empatia, nos colocar no lugar do outro, nos afastando da posição de dono da verdade.
"Queremos sempre ser donos da verdade, mas a verdade quando se torna absoluta ela deixa de ser verdade"
Muito se ouve de pessoas que se decepcionaram na doação, por isso deixaram de doar. Por que isso ocorre?
Aqui entra uma reflexão mais profunda. Devemos pensar qual a minha motivação para ajudar o outro. É uma motivação incondicional ou é condicionada a algo, ou seja, estou esperando receber algo em troca. De alguma forma estou barganhando essa doação. Neste caso, virá a decepção. Precisa pensar diferente, que fez a sua parte com honra ao mérito e louvor e durma em paz. Não importa como o outro recebeu. Então, tenho sempre que vigiar a minha motivação porque, se estava esperando receber algo em troca, a doação não era genuína, nem verdadeira. Por isso que nos decepcionamos e criamos essa blindagem de não querer mais ajudar ninguém. A reflexão é: vou fazer algo pelo próximo porque eu quero e esse desejo tem que estar na minha alma. Faça sem esperar retorno. Convido o leitor a pensar sobre isso, faça, doe, sem pensar em troca. Não podemos salvar o mundo, mas o mundo de uma pessoa eu posso salvar.
Podemos dizer que estamos doentes?
Infelizmente, é uma realidade. Nunca estivemos tão doentes quanto agora. Se a dor do meu irmão não dói em mim, o doente sou eu. O que notamos é que cada vez mais as pessoas estão mais resistentes, individualistas, mas ainda dá tempo de reverter isso. Gosto muito da palavra esperança. Esperança significa esperar com confiança. Vemos as pessoas se digladiando com as outras, feridas, machucadas. Não sabemos o que passa na vida do outro muitas vezes. Temos que exercitar a misericórdia, ter um olhar de compaixão e não de pena, porque a pena é um olhar reducionista. Mas, o olhar de misericórdia, de compaixão, traz dignidade a pessoa que recebe. Estudei muito a vida de Madre Teresa e ela dizia que mãos que fazem, são mais sagradas dos que os lábios que somente rezam. Convido as pessoas para a ação, para doação incondicionada. Cuidado ao julgar, condenar, sentenciar o outro porque a vida, às vezes, vai te colocar naquele lugar.
"Nunca estivemos tão doentes quanto agora. Se a dor do meu irmão não dói em mim, o doente sou eu"
Qual mensagem deixaria aos leitores?
Que estender a mão para o outro é correr o risco de se envolver; que dispor seus sentimentos é correr o risco de mostrar o seu verdadeiro eu; defender seus sonhos e ideais diante da multidão é correr o risco de perder e reconquistar a amizade das pessoas; que amar é correr o risco de não ser correspondido; viver é correr o risco de morrer; confiar é correr o risco de se decepcionar; que tentar é correr o risco de fracassar. Mas, está tudo bem. Recomece, não deixe de arriscar. Que cada um possa fazer sua parte, por mínimo que seja, pode ser um grão de areia no oceano, ninguém perceberá que você fez, mas saberá que naquele oceano tem um grão de areia a mais. Então, faça sua parte.