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“Mais informação, menos preconceito”



“Mais informação, menos preconceito”

Assim como os portadores da síndrome de Down, os autistas também lutam por menos preconceito. A arma é a mesma: a informação. Por isso, o título da entrevista da semana é a repetição da semana passada, quando Franciele Muniz, coordenadora de Saúde da Apae, fez a abordagem sobre o Dia Mundial da Síndrome de Down.  Ana Lúcia Cotrim Gomes de Albuquerque, que coordena o projeto Luz Azul em defesa dos direitos dos autistas, fez coro ao movimento por “mais informação, menos preconceito”. Aliás, esse é o tema do Dia D de Conscientização do Autismo que é celebrado neste domingo, 2 de abril. Em Fernandópolis, o projeto Luz Azul surgiu em 2021 e teve como primeiro ato o lançamento da Carteira Oficial do Autista, que foi instituída no Brasil por lei aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente, que ficou conhecida como a Lei Romeo Mion, referência ao filho mais velho do 
apresentador Marcos Mion, que é autista.
A advogada Ana Albuquerque, mãe do Frederico de seis anos que tem autismo moderado, diz que está à frente com o objetivo de melhorar a vida do filho e de crianças autistas. Em Fernandópolis, o projeto Luz Azul, com o apoio da Prefeitura, já tem cadastrado 156 crianças autistas. O projeto já está chegando a outras cidades e envolve na região 250 famílias. 
Para celebrar o Dia de Conscientização do Autismo, famílias vão realizar neste domingo uma passeata pelo centro da cidade a partir das 10 horas e soltar balões azuis. Ana Albuquerque falou dos avanços do projeto Luz Azul nesta entrevista ao CIDADÃO. Leia:

Também no autismo a luta é por mais informação e menos preconceito?
Sim. Esse ano a campanha tem justamente esse tema. O preconceito só diminui com a informação, a sensibilização, na conscientização das pessoas. E isso é necessário porque a quantidade de autistas aumenta. Temos uma estatística de que a cada 36 crianças, uma nasce autista. Então a gente vê que toda família terá uma pessoa autista, ou um vizinho, ou o seu filho na escola terá algum amigo. Isso é estatística e não tem como negar.

E como é possível quebrar esse preconceito?
Além do conhecimento é necessário desmistificar a ideia que o autista é aquela pessoa que ficará se batendo o tempo todo. Não é assim. Existem níveis de autismo. Falta também o tratamento. Quando chega o conhecimento, a família também vai procurar o tratamento adequado. Começa pela família que vai irradiar a informação para os mais próximos. É um trabalho de formiguinha. Quando fazemos palestras procuro falar de autistas famosos. Temos uma história que o Albert Einstein foi autista, alguns pintores famosos, o Bill Gattes se declarou autista, a ativista ambiental Greta Thunberg, o jogador Messi não se assume, mas dizem que é autista. Temos vários personagens que ajudam a desmistificar essa ideia de que o autista não conseguirá fazer nada. Não, ele vai conseguir. Com o tratamento adequado ele fará uma faculdade, chegará aonde ele quiser, com as dificuldades, adaptações e inclusões necessárias na vida desse autista. Tivemos um evento em Jales que veio a família Brito, que ficou bastante conhecida no Brasil. O Nicolas Brito, filho do casal Alexsander e Anita, foi o primeiro autista severo a ser incluído na escola regular no Brasil. O Nicolas não falava até os 12 anos, ele só gritava. Com tratamento adequado, hoje com 23 anos é palestrante internacional e ganhou prêmio como melhor fotografo nos Estados Unidos. Eles podem chegar aonde quiserem e o nosso papel é acreditar e lutar com eles.

Quase dois anos do projeto Luz Azul, quais foram os avanços?
Primeiro, todos ficaram sabendo o que é autismo. Desde o comércio, os postos de saúde. Temos a carteirinha para que todos saibam que ali tem um autista. O Luz Azul permeia as várias secretarias de governo. Ficamos um tempo na Assistência Social com o TEA Abraço que era o acolhimento familiar, a entrega da carteirinha, informações sobre os direitos, então, tinha todo um trabalho social. Esse ano o Luz Azul está mais focado na saúde (no Posto do Pôr do Sol) para melhorar o tratamento mesmo. Temos algumas ações na Cultura com o projeto de realizar um musical com os autistas. O projeto “Autizando na Escola” que é voltado para a Educação que é o tempo todo, porque a criança fica a maior parte do tempo na escola. Atuamos junto com o Conselho Tutelar. Sabemos da burocracia do poder público, mas pelo menos nas escolas municipais todo aluno autista tem um cuidador, o que nem sempre ocorre em escola particular. Então em Fernandópolis, a inclusão está acontecendo. Falo pelo meu filho, o Fred, que começou a frequentar a escola regular no município com 5 anos (hoje está 6). Ele adora a escola. Ele não precisou ir para uma escola especial. Nesse ano a gente construiu uma rede de apoio Luz Azul que não ficou só em Fernandópolis. Hoje temos 156 autistas em Fernandópolis e já somos 250 famílias na região. É uma troca imensa de experiência entre as famílias. Hoje estamos levando o Luz Azul para outros municípios e até outros estados. Agora mesmo em abril estamos com eventos em várias cidades. Faz parte da missão espalhar o Luz Azul para toda a região. 

Quando chegaram ao número de 156 autistas em Fernandópolis, isso surpreendeu?
Muito. Eu me surpreendo todos os dias, porque é difícil o dia que não recebo uma família nova não me procura falando do diagnóstico do filho e vem para fazer a carteirinha. Esse número se altera praticamente todo dia. A família chega buscando ajuda, desesperada com o diagnóstico e não sabe por onde começar. Então, o primeiro momento é o acolhimento, o abraço, o carinho. Esse é o papel do Luz Azul que está fazendo a diferença. São 250 famílias se apoiando, se ajudando.

Como reconhecer um autista?
O autismo não tem cara, por isso que veio a carteirinha. Eu sempre falo para as mães para que quando forem em locais públicos utilizem o cordão, seja com o símbolo do girassol ou do quebra cabeça. O abafador de ruídos (tipo fone de ouvido) é um equipamento usado pelo autista que ajuda também a identificá-lo. Mas, o ideal é identificar a criança com o cordão. Quando isso ocorre, o atendimento é diferenciado. 

Órgãos públicos, comércio, estão preparados para esse atendimento diferenciado?
Sim. Está melhorando muito. Já vejo no comércio algumas lojas colocando o símbolo e com a identificação da preferencial com o laço do quebra-cabeça. O Banco Itaú da prefeitura é um exemplo disso. Aqui em Fernandópolis está melhorando bastante e a Secretaria de Trânsito fornece a credencial com o laço para estacionamento prioritário. A ideia agora é inserir o laço na demarcação das vagas reservadas para estacionamento de idosos e deficientes compartilhando esse espaço público. Por isso, temos que continua investindo na informação para sensibilizar as pessoas. Só vamos quebrar o preconceito com a informação. Muitas pessoas acham porque não tem um autista em casa não precisa saber dessas coisas. Mas, em algum momento isso vai fazer parte por diferentes razões. Hoje a Síndrome de Down é mais divulgada, mais respeitada. Ainda lutamos pelos nossos filhos autistas. Queremos apenas respeito. Antes de ser autista, ser down, eles são seres humanos. 

Como deve ser a abordagem de uma criança autista?
Como são literais, não pode frases muito longa. Tem que ser um discurso simples e direto. Evitar chegar abraçando. Dê atenção e carinho.

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