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O patriarca centenário



O patriarca centenário

Em Fernandópolis, cada vez mais famílias estão podendo comemorar essa data ao lado de pais centenários. É o caso da família Salioni, onde o patriarca Armando Antonio Salioni, do alto dos seus 98 anos (no registro de nascimento) ou 101 anos na vida real (como ele conta), esbanja lucidez, saúde e disposição. Sua maior reclamação neste momento é ter que ficar confinado  no apartamento no Edifício Jardim América por conta da pandemia do coronavírus. Gostaria mesmo de retomar suas caminhadas até a praça Joaquim Antonio Pereira, encontrar os amigos e fazer o que gosta: comprar e vender relógio. 
CIDADÃO entrevistou “seo” Salioni por telefone e watsapp,  com auxílio da filha Maria Luiza Salioni (a professora Malu) que mora no mesmo prédio e o acompanha de perto. Durante o dia ele tem a companhia de uma senhora que cuida dos afazeres, mas se vira sozinho e muito bem. “Seo” Salioni, que nasceu em Rio Preto, chegou jovem na Brasilândia, recém casado, acompanhando o pai, Amadeu Saglioni, que vendeu um armazém que tinha em Talhado e veio pra cá. Os pais Amadeu Saglioni Tereza Zago vieram da Itália no período da imigração italiana. Viveu o drama de ficar viúvo logo depois do nascimento do segundo filho. Três anos depois reconstruiu a vida ao lado de dona Maria Catelani Salioni, com quem teve outros cinco filhos. A família de sete filhos aumentou com a chegada de 11 netos e seis bisnetos. 
Na longeva história de vida, Armando Antonio Salioni viveu diferentes experiências, trabalhando com o pai “Seo” Amadeu, depois como dono de caminhão, de uma empresa de ônibus, de uma fábrica de macarrão e de comprador e vendedor de imóveis, onde ganhou e perdeu dinheiro. Era rico, ficou pobre, mas o desapego aos bens materiais e a ausência de mágoas, explicam em boa medida sua longevidade. Costuma dizer que tudo está ótimo e que viveu do jeito que queria. Mas, se arrepende mesmo de ter entrado na política. Foi eleito vereador pela Arena em 1972, quando se elegeu prefeito Antenor Ferrari. Naquela época, vereador não tinha salário.
Anos atrás, após enfrentar uma cirurgia, revelou aos filhos três desejos: tomar uma sodinha limonada gelada, beber um copo de chope no Pinguim em Ribeirão Preto e visitar os túmulos das esposas. Beber chope em Ribeirão virou celebração da vida. 
Leia a entrevista deste pai centenário que tem grande orgulho de ter dado diploma universitário para todos os sete filhos:

“Seo” Antonio vamos começar falando de sua idade. Quantos anos o senhor tem?
Eu nasci em 8 de julho de 1919 em Rio Preto. Como nasci muito doente, o meu pai esperou três anos para me registrar. A gente morava na Fazenda Velha. Três anos depois que nasci, meu pai me levou para o Cartório em Rio Preto. Quando fizeram o registro, colocaram 1922. Mas, eu nasci em 1919. Tenho 101 anos. 

"Como nasci muito doente, o meu pai esperou três anos para me registrar. Nasci em 1919 e tenho 101 anos"

Como foi a chegada na Brasilândia?
Meu pai tinha uma venda (estabelecimento de secos e molhados) em Talhado. Ele vendeu lá e comprou uma venda na Brasilândia, que estava mais desenvolvida que a Vila Pereira. Ele montou uma casa de secos e molhados. Vendia de tudo. Quando chegamos era o início em 1940. Trabalhei cinco anos com meu pai. Depois comprei um caminhão e puxava arroz para a Votuporanga. Depois, em 1950, surgiu o trem, fui em São Paulo comprei um ônibus (jardineira) para levar o povo para a Estação. Começou com um e depois foi aumentando. Chegou a ter três horários de trem na época. Fui comprando outros ônibus e montei uma empresa. Foi o primeiro transporte coletivo da cidade. O pessoal da Brasilândia apelidou o ônibus de “mijoleta”. Vendi a empresa e fui trabalhar vendendo e comprando casas. Eu comprava terreno, construía casas e vendia.  
O senhor já veio casado ou foi aqui que constituiu família?
Vim casado (com Ana Zaqueu Salioni) pra cá. Casei lá em Talhado e um mês depois vim para a Brasilândia.
O senhor ficou viúvo logo depois do nascimento do segundo filho. Como se virou naquela época com dois filhos pequenos?
Minha mulher morreu no parto. Na época, o Alceu (filho mais velho) foi com meu pai. A Ana Maria, logo que nasceu, foi com minha sogra e meu sogro para Ecatu. E eu fiquei aqui junto com meu pai. 

"Dei escola para todos os sete filhos, todos fizeram faculdade e se formaram. Fico muito orgulhoso disso"

Logo depois o senhor se casou de novo e teve mais cinco filhos? 
Daí três anos, me casei de novo, com Maria Catelani Salioni e tivemos mais cinco filhos (Antonio, Malu, Paulo, Regina e José).
Como pai, o senhor sempre teve uma meta, o de garantir que todos os filhos tivessem diploma universitário. O senhor conseguiu esse objetivo?
Consegui. Dei escola para todos eles, todos fizeram faculdade e se formaram. Dei também uma casa para cada filho. Todos estão bem, graças a Deus. Fico muito orgulhoso disso. 
E a história da fábrica de macarrão? 
A fábrica de macarrão, montei com meu irmão (Pastifício Fernandópolis, na década de 1960), mas naquele tempo o Matarazzo vendia o macarrão mais barato do que eu podia vender. E o povo não comia macarrão, só comia arroz. Fiquei dois anos com essa fábrica e vendi. Fui comprar e vender imóveis. 
O senhor também entrou na política e se elegeu vereador em 1972 durante o mandato de Antenor Ferrari. Como foi?
Foi muito ruim. Entrei na política, gastei muito dinheiro na campanha durante 90 dias. E naquele tempo para ser vereador não se ganhava nenhum tostão
Se arrependeu de entrar na política?
Arrependi, bastante. Era uma época de política quente, muito ruim. Fui quatro anos vereador na época do Antenor Ferrari. 
E hoje, o senhor ainda acompanha política? 
Acompanho e vou votar na eleição.
O senhor sempre ia na Praça da cidade. Tá difícil a quarentena do coronavírus?
Tá difícil, ficar em casa quatro meses, é muito ruim. Queria estar andando pela rua, fazendo negócios, compra e venda de relógio com os amigos na praça.

"Fiz uma promessa que se sarasse depois da cirurgia, queria tomar uma sodinha limonada e um chope no Pinguim em Ribeirão"

E essa história de ir tomar chope em Ribeirão Preto?
Fiquei doente e fui operado do pulmão, quase morri. Fiquei uns 30 dias sem conhecer ninguém. Ai fiz uma promessa: se sarasse eu ia visitar o túmulo da milha mulher, tomar uma sodinha limonada e ia em Ribeirão Preto tomar um chope com meu filho no Pinguim. Tudo isso aconteceu. O desejo de tomar sodinha é porque tinha vontade, fiquei 30 dias sem beber água. Nessa época quase morri, não conhecia nem os filhos. 
O senhor toma algum tipo de remédio?
Não tomo nenhum remédio. Nada. 
De onde vem essa vitalidade?
Tenho muita fé em Jesus Cristo e Nossa Senhora Aparecida.

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