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“O tráfico de drogas é uma mola propulsora para a prática de outros crimes”



“O tráfico de drogas é uma mola propulsora para a prática de outros crimes”

O delegado da Dise – Delegacia de Investigações Sobre Entorpecente - Vinicius Oliveira dos Anjos está no comando da delegacia especializada há um ano e sete meses, tempo suficiente para identificar o cenário do tráfico de drogas em Fernandópolis e região. Ele diz que “o tráfico de drogas é uma mola propulsora para a prática de outros crimes”, mas reconhece que, comparada a outras regiões, a de Fernandópolis tem um cenário “mais tranquilo”. O delegado ingressou na carreira da Polícia Civil em 2009 com passagem por Osasco, Promissão, Ouroeste, 1º DP e, agora, na Dise em Fernandópolis. Ele é o entrevistado da semana. Leia:

Como avalia a posição de Fernandópolis em relação ao tráfico drogas?
Aqui é uma região que, em termos de criminalidade, se comparada a outras localidades é um pouco mais tranquila. Por exemplo, a minha experiência em Promissão mostrou um quadro pior em relação a criminalidade. Quando vim para a região de Fernandópolis, senti essa diferença. Aqui temos poucos roubos, poucos crimes violentos, mas a questão do tráfico de drogas, infelizmente, atinge todas as camadas sociais, não tem limites. E aqui na região de Fernandópolis não é diferente, embora a gente perceba uma atuação menor em relação ao tráfico de drogas, comparada a cidades vizinhas.

O tráfico em Fernandópolis ainda é praticado por pequenos traficantes?
O que tenho observado é que não temos aquele traficante expressivo. Na verdade, são pequenos traficantes que movimentam pouca quantidade de entorpecente. Evidentemente, pode ter um ou outro que movimente uma quantidade mais expressiva, mas a gente observa isso de forma mais expressiva nas cidades vizinhas. Em Votuporanga, dias atrás, a Dise de lá fez uma grande apreensão de 500 quilos de maconha.

"O tráfico de drogas, infelizmente, atinge todas as camadas sociais"

O que a Dise tem feito para coibir a ação desses traficantes?
O nosso trabalho é puramente investigativo. Desde que assumi a Dise nós já fizemos 50 flagrantes, prendemos 66 traficantes e apreensão de 31 quilos de drogas (28 quilos de maconha, 1,5 quilo cocaína, 1 quilo de crack e o restante de drogas sintéticas). Se for considerado o valor de custo final para o traficante, essa droga apreendida deve estar avaliada em mais de R$ 100 mil. Se considerar que o traficante vai porcionar essa droga para vender a um preço superior, essa quantidade de entorpecente pode chegar a R$ 400 mil. 

Pelo fato de Fernandópolis ser uma cidade universitária, isso é um atrativo para o tráfico de drogas?
Sim, tem essa questão também. Como o consumo de entorpecentes atinge todas as camadas sociais, também está presente neste meio. O perfil, no caso, é mais de consumo e não de tráfico em si. Já existiu investigação envolvendo estudantes universitários que estavam comercializando drogas. Lembrando que nem sempre o traficante é só aquele que vende cocaína, maconha, ecstasy ou crack. As vezes tem algumas substâncias controlada pela Anvisa, um medicamento de uso especial por exemplo, que se for vendida também pode configurar o crime de tráfico. Atualmente está muito difundido a venda dos medicamentos comercialmente denominados Ritalina e Venvanse de forma clandestina. Isso configura o crime de tráfico. Temos uma investigação em andamento, que não posso dar mais detalhes, que envolve essa questão.

"O impacto das drogas é devastador na família e até na economia"

O tráfico está na raiz de outros problemas de segurança pública?
Com certeza, o tráfico de drogas é uma mola propulsora para a prática de outros crimes. O indivíduo que é viciado em drogas e é menos favorecido economicamente, obviamente vai praticar pequenos crimes de furtos, roubos, podendo chegar até latrocínio, tudo para conseguir levantar dinheiro para sustentar o vício. As drogas mais traficadas na região são a cocaína e maconha e, infelizmente, podemos dizer que o consumo está disseminado em todas as classes. Talvez as classes menos favorecidas, pela condição financeira, partem para o consumo de drogas mais baratas, como a maconha e crack.

Qual o impacto na comunidade?
O impacto é devastador. A família sofre por ter alguém viciado em drogas, a sociedade, porque muitas vezes o trabalhador que faz economia para comprar um bem, um carro, uma moto, tem esse bem subtraído e deixado na biqueira onde o usuário vai e troca por droga para consumo. 

"A participação da população no combate ao tráfico de drogas é fundamental"

Os pais são, na maioria das vezes, surpreendidos quando a Polícia bate à porta. Como é lidar com esse problema?
A reação dos pais é a pior possível. Muitos desconhecem ou não querem enxergar o que os filhos estão fazendo. Num primeiro momento, vem a reação da surpresa e desespero por parte dos pais, o que é natural. Mas a gente sempre passa a orientação para que os pais estejam vigilantes, acompanhem de perto, observem com quem os filhos estão andando, as redes sociais, o que estão fazendo. Alguns ficam muito surpresos e não coadunam com essa prática. Outros a gente vê que já têm conhecimento e enfrentamento com o filho, mas não tem o domínio da situação e isso gera uma sensação de impotência dos pais.

E o envolvimento de menores no tráfico?
A experiência que tive aqui na Dise, a maioria das pessoas que a gente prendeu são maiores de idade. Mas, sabemos que os traficantes arregimentam esse tipo de público para vender a droga, porque sabem que o adolescente não permanecerá por muito tempo internado. Agora, se esse adolescente for pego em outro ato infracional assemelhado ao crime de tráfico, o tempo de internação dele vai ser maior. A repetição de casos de pessoas com o tráfico é uma realidade. 
Rio Preto, que é a principal cidade da região, apresenta uma espécie de guerra entre gangues por envolvimento no tráfico. E por aqui?
Por aqui não temos notícias desse tipo de problema. Cerca de dois anos atrás tivemos uma ocorrência mais ou menos similar a essa retratada, mas estava relacionada mais ao ‘tribunal do crime’, ou seja, um traficante não teria pago fornecedores e teve um acerto relacionado a essa questão. Desde que estou atuando aqui, essa foi a primeira vez de algo semelhante na região de Fernandópolis.

As redes sociais têm ampliado o problema do tráfico e uso de drogas?
Geralmente a notícia da venda da droga é feita pelas redes. Os traficantes, assim que estão na posse do entorpecente, já começam a enviar mensagens. Só que eles divulgam isso em grupos privados, onde estão os clientes. É um meio contemporâneo de divulgação para venda dessa droga e que temos atuado em investigações. E isso vem para dificultar um pouco mais o nosso trabalho, porque a divulgação ocorre em grupo de usuários de droga de forma restrita, diferente do traficante que faz a venda na esquina e que pode ser visto e denunciado pela população. Isso ainda existe, mas é um percentual cada vez menor. Ainda recebemos esse tipo denuncia de determinada movimentação estranha e vamos investigar. Mas, isso tem ocorrido numa constância menor. Nas redes sociais, nem sempre a gente tem acesso a essas informações privilegiadas. 

Como fazer uma denúncia para a Dise?
A participação da população no combate ao tráfico de drogas é fundamental. A polícia não é onipresente, não podemos estar nos mesmos lugares ao mesmo tempo. Então se a população observa uma movimentação estranha em determinada casa ou sabe que uma pessoa está comercializando essa droga é importante que entre em contato com a Dise para fazer essa denúncia. Os dados, a identidade dessa pessoa, serão totalmente preservados no mais absoluto sigilo. Nós temos telefones que estão à disposição: (3463-2522/ 3463-1707).

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