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“Saio porque não consigo levar com a barriga”



“Saio porque não consigo levar com a barriga”

No dia 26 de janeiro, o comerciante Saulo dos Santos Marin, 58 anos, foi aclamado presidente da Acif – Associação Comercial e Industrial de Fernandópolis. Chegou com gás para uma gestão que qualificava como uma “oportunidade cheia de desafios”. Dez meses depois, tornou pública a renúncia do cargo. Em entrevista ao CIDADÃO e Rádio Difusora, alegou “inconvenientes profissionais” para os quais precisa dedicar mais tempo. “Como cidadão, e isso é da minha personalidade, como se diz no popular, não consigo levar com a barriga. Se não consigo o tempo necessário para desenvolver o que preciso, prefiro deixar”, enfatizou. Juntou-se a isso, a falta de apoio de parte da diretoria, que sumiu após a eleição. “Se não existir união, colaboração e fortalecimento da equipe, você não consegue levar nada para frente”, acrescenta. Marin também deixou um alerta: “Nós temos uma cidade maravilhosa, um comércio que tem que ser melhorado no sentido de buscar novas opções, porque senão a internet, a tecnologia vão acabar engolindo a gente”. Na próxima semana, a Acif deve definir o novo presidente ou nova presidente. Leia a entrevista:


Como está o processo para escolha do novo presidente da Acif, diante da sua renúncia?
Tomada a decisão de deixar o cargo, ela foi passada para o Departamento Jurídico e Conselho da Acif, como manda o estatuto. A partir daí o conselho toma algumas providências e a primeira será a convocação de assembleia para o dia 11 de novembro, 7 horas, onde será colocado o cargo à disposição dos três vice-presidentes (da Indústria, do Comércio e de Serviços). Uma dessas três pessoas pode assumir o cargo conforme ordena o estatuto. Não podendo nenhum deles assumir, passa-se sucessivamente para os três suplentes e pode até chegar a uma pessoa da diretoria, independente do cargo. Somente em caso de não aparecer nenhum nome da diretoria é que se marcará uma nova eleição, abrindo-se inscrições para chapas.

Acredita em quanto tempo essa questão estará resolvida para você efetivamente deixar a presidência da entidade?
Como essa decisão já foi comunicada à diretoria, tem-se a manifestação de algumas pessoas que poderão assumir. Temos pelo menos dois nomes que manifestaram interesse. Creio que no dia 11, data da assembleia, provavelmente já teremos o novo presidente ou nova presidente. Isso já está praticamente definido.

"Se a gente não se unir, não se ajudar, vamos ficar nesse marasmo como estamos hoje"

A possibilidade de convocação de nova eleição, que a última hipótese prevista no estatuto, está descartada?
Até porque a gente tem os candidatos que se propõem a assumir a presidência.

Em janeiro você foi aclamado presidente da Acif e, dez meses depois, apresenta renúncia, fato inédito na história da entidade. O que o levou a tomar essa decisão?
A Acif sempre teve seus presidentes cumprindo o mandato, assim como gostaria de fazer. Perante a situação atual, tenho alguns inconvenientes profissionais que preciso dedicar mais tempo. Acredito que não consiga tempo necessário para desenvolver o trabalho planejado na Acif. Como cidadão, e isso é da minha personalidade, como se diz no popular, não consigo levar com a barriga. Se não consigo o tempo necessário para desenvolver o que preciso, prefiro deixar. Juntando isso com um pouco de falta de apoio de parte da diretoria que foi eleita e que, a partir do momento que passou a integrar o quadro, sumiu, desapareceu, sobrecarregando os demais diretores. Se não existir união, colaboração e fortalecimento da equipe, você não consegue levar nada para frente.

"A Acif está rodeada de muita gente boa, qualificada. Não será meia dúzia que vai fazer acontecer"

Nesse período que você esteve como presidente tivemos a fase mais aguda da pandemia decretação de lockdown, o surgimento de um grupo dissidente no comércio, a campanha RespiAção e a saída do gerente administrativo Geraldo Paschoalini. Qual foi o peso desses fatores na sua decisão?
Na realidade, a minha decisão não foi tomada por nenhum desses fatos citados. A campanha RespirAção foi fantástica com colaboração intensa de toda a diretoria, que achei que iria continuar, com uma arrecadação maravilhosa com ajuda da população, dos comerciantes, a prefeitura nos auxiliando em tudo que a gente precisava. Então foi perfeito. A saída do gerente da entidade, acho que estava na hora, com 25 anos de empresa sempre se almeja sonhos e ele tinha esse sonho e, administrativamente a Acif não parou, pelo contrário, melhorou. Nós tivemos uma economia de folha de pagamento nos últimos oito meses de mais de 40%. A Acif tinha uma receita que quase não cobria as despesas. Então, tudo isso nós estávamos administrando. Quanto ao grupo dissidente, não considero dissidência, considero que grupo era como eu há 3 ou 4 anos que não conhecia a Acif, não sabia como funcionava internamente, não queria participar de nada, achava que não funcionava. A partir do momento que entrei e vi como funciona, tanto que cheguei a presidente, eu quis ajudar. Então, esse grupo dissidente, talvez, é mais político do que contra a Acif. Acredito muito que se existisse boa-fé, bom senso, eles poderiam integrar a diretoria e fazer acontecer o que eles têm vontade. Acho que se existir um grupo dissidente, ou é má fé ou falta de bom senso.

Qual o recado que você pretende passar com a renúncia para o futuro da Associação Comercial?
Parto do princípio daquela situação antiga, passada pelos nossos pais, de que se conselho fosse bom não se dava. Se vendia. Mas, acredito muito que se não existir uma união, se todos não dispuserem de um pouquinho do tempo para ajudar aquilo do que vivemos, o comércio, que é o maior gerador de receita para a cidade, fica difícil. Veja bem, a gente marcava uma reunião, precisando da voz do empresário, e ele manda um funcionário. Com que responsabilidade, não que não tenha, mas ele não é dono do negócio, ele não vive a parte financeira, não vive a parte contábil, não vive o dia a dia da família do empresário, com que responsabilidade e conhecimento ele vai decidir uma situação referente a empresa. Se você não tem o empresariado engajado em querer melhorar a cidade, vamos ter problemas. Nesse curto período fizemos a prefeitura, a Câmara de vereadores chegar perto da Acif e a entidade se dispôs a negociar muitas situações que antigamente não existia. Formou-se um relacionamento onde todos pensavam o crescimento da cidade, porém, ficamos com falta do empresariado, das pessoas que realmente têm que ajudar. Se a gente não ajudar, vamos ficar nesse marasmo como estamos hoje. Precisamos decidir uma coisa e ninguém participa. Isso é complicado. O recado que deixo é que, se a gente não conseguir se juntar cada vez mais, vamos perder, outras cidades da região vão se fortalecendo, ganhando terreno, mercado e Fernandópolis vai ficando parada no tempo. Nós temos uma cidade maravilhosa, um comércio que tem que ser melhorado no sentido de buscar novas opções, porque senão a internet, a tecnologia, vão acabar engolindo a gente.

"Não vivemos do passado. Temos que pensar daqui para frente e fazer uma cidade melhor para todos"

Acha que a Acif não explora bem a força que tem para ajudar no desenvolvimento da cidade?
Acho que o comércio, o empresariado da cidade, está distante da Acif. Todos precisavam estar mais próximos. A entidade tem muita força, pode oferecer muito para a cidade. Nós vamos inaugurar na semana que vem o Sebrae e a Casa do Empreendedor dentro da associação, que era um sonho da diretoria em transformar aquilo em centro empresarial onde a pessoa vai lá com a ideia de abrir uma empresa e sai com a empresa aberta. Então, a Acif não está longe, ela está perto. O que precisa é todos se unirem. Vamos esquecer o passado, se teve administração boa, má, regular, já foi. Não vivemos do passado. Temos que pensar daqui para frente. Nossa família mora aqui, nossos filhos estão aqui. Então, porque não fazer daqui uma cidade melhor para todos.

Você chegou com muita expectativa no cargo, dez meses depois sai decepcionado?
Não saio decepcionado, muito pelo contrário, saio satisfeitíssimo, saio com a ideia de que aquilo que foi colocado como meta por essa diretoria vai continuar. As pessoas que estão com intensão de assumir, estavam comigo na diretoria e tem o mesmo pensamento de investir em treinamento. O comércio precisa de treinamento, os empresários precisam de treinamento, precisamos investir na qualidade no atendimento. Hoje temos sobra de cargos na cidade. Quando se fala de falta de emprego é muito figurativo. Temos é falta de mão de obra qualificada, ou seja, tem a vaga, mas falta a pessoa qualificada. Precisamos trabalhar muito isso. Assim como a educação rege o país, o nosso treinamento e qualificação regem o comércio. Saio e vou continuar no conselho da associação, como ex-presidente e, no que puder ajudar, vou continuar ajudando, mas deixo para algumas pessoas tentar agregar mais ainda. A Acif está rodeada de muita gente boa, qualificada. O que precisa é fortalecer mais ainda. Não será meia dúzia que vai fazer acontecer. É o comércio se juntando, ou pelo menos dando palpite.

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