A coordenadora de projetos do Instituto de Desenvolvimento Pessoal e Social Os Sonhadores de Fernandópolis Juliana Alves da Silva está vivendo uma experiência que qualifica como “transformadora”. É que a OSC – Organização da Sociedade Civil (como são chamadas agora as entidades), que ela representa, foi um dos projetos selecionados no concorrido edital aberto pela Organização Social Gerando Falcões de Poá/SP para ingressar na Falcons University, uma faculdade com o intuito de criar e educar novos líderes sociais trabalhando os seis pilares centrais como: habilidades socioemocionais, expertise de favela, expertise do setor privado, políticas públicas, tecnologia e inovação. Juliana está no Instituto Os Sonhadores desde 2016 e criou vínculos com a comunidade onde atua, numa região da cidade formada por bairros como Brasilândia, Barbosa, Eldorado, São Judas Tadeu, Brasília e Paulista.
Em entrevista ao CIDADÃO, Juliana Alves conta sobre a caminhada, da inscrição ao processo de seleção para integrar um grupo de 58 líderes sociais selecionados em todo o Brasil para participar da Falcons University, dentre os 840 inscritos. “Isso abriu horizontes, porque estávamos restritos à realidade de Fernandópolis, no máximo Rio Preto”. Ela também fala do Instituto Os Sonhadores, do trabalho em plena pandemia e dos resultados alcançados. Leia a entrevista:
Uma experiência transformadora
Como surgiu a oportunidade de participar desse projeto?
Nós fazemos parte de algumas instituições que são contempladas pela ação social cooperada, Credicitrus e Coopercitrus, por exemplo, e eles disponibilizam algumas capacitações. Eu fui em uma capacitação e conheci o Instituto “As Valquírias” de Rio Preto. É um instituto que a gente acompanha, conhece a história deles e é uma OSC (Organização da Sociedade Civil – novo termo como são reconhecidas as entidades) acelerada pela Organização Social Gerando Falcões. Já estávamos acompanhando isso quando saiu o edital, no comecinho do ano, para o novo semestre de alunos. O edital é para a gente entrar na Universidade, porque eles têm o projeto de acelerar as OSCs, ajudar a melhorar o trabalho, na captação de recursos e até de ajuda financeira. Só que para ter essa ajuda financeira, primeiro você vai passar pela universidade, onde eles vão ensinar o processo para depois darem um aporte financeiro. Para isso é preciso ter já curso universitário, ter tido bom desempenho. A gente entrou no edital, inscreveu o projeto Os Sonhadores. O edital mexeu muito comigo, me fez refletir sobre muitas coisas. Não se tratava apenas de inscrever um projeto, mas de relatar sobre sua infância, de onde veio, porque está aqui, porque gosta de fazer isso, então, foram levantadas questões que me levaram a uma reflexão sobre tudo à minha volta. Muita coisa que eu não me dava conta, fui perceber nestes questionamentos, até sobre minha trajetória de vida dentro do social. Eu tinha experiência familiar de muito envolvimento social em projetos contra as drogas, em entidades, horta comunitária. Isso aumentou o nosso interesse em participar. Fizemos a inscrição e fomos selecionados na primeira fase do projeto. Fomos passando por entrevistas, fizemos vídeo mostrando a instituição, a nossa comunidade, para eles entenderem o contexto de Os Sonhadores. E fomos avançando as etapas, até passar por entrevista com o reitor da universidade o LeMaestro. Depois das entrevistas fomos para outra fase com teste de engajamento de propósito, culminando com a aprovação. Estamos participando desde o comecinho de agosto das primeiras aulas online. Foi quando recebemos informação de que foram 840 projetos inscritos e estamos entre os 58 líderes sociais que foram selecionados do Brasil inteiro. Está sendo muito legal porque estamos trocando experiências com gente de todas as partes do Brasil. Isso abriu horizontes, porque estávamos restritos à realidade de Fernandópolis, no máximo Rio Preto. Tem gente que trabalha com comunidade indígena, tem gente que não tem prédio como nós temos. Está sendo fantástico.
"Foram 840 projetos inscritos e nós estamos entre os 58 lideres sociais selecionados no Brasil inteiro"
O que espera dessa oportunidade?
Creio que serão cinco meses de muito aprendizado com líderes sociais incríveis e lideranças inspiradoras como é o caso do fundador da Gerando Falcões Eduardo Lyra e do reitor da Falcons University, LeMaestro. Temos nos dedicado ao máximo para adquirir todo conhecimento possível e melhorar cada vez mais o trabalho oferecido às crianças, adolescentes, famílias e comunidade atendidas pelo Instituto Os Sonhadores. Participar da Falcons University tem sido uma experiência transformadora.
Quando você chegou aqui no Instituto Sonhadores?
Eu entrei em julho de 2016 como orientadora social, que trabalha com os grupos das crianças. Em janeiro de 2017 eu passei a ocupar a coordenação de projetos. Em janeiro completarei quatro anos. Tudo isso, graças as experiências anteriores e o meu contato com essa comunidade é anterior, desde infância. E hoje estou aqui neste projeto social.
"Serão cinco meses de muito aprendizado com líderes sociais incríveis e lideranças inspiradoras"
O Instituto Os Sonhadores vai além do trabalho musical?
Estamos completando 19 anos de fundação através da iniciativa do Marcos Vilela. Começou com o esporte e depois veio a ideia de incluir a música, que hoje virou referência na entidade. Mas, além da música, com aulas de violão, violino, violoncelo, trabalhamos com projeto de jiu jitsu, recreação, lazer, atividades em fanfarra, ordem unida, além de atividades voltadas para áreas socioassistênciais, com trabalho de várias temáticas, como vínculo familiar, uso de drogas, bullyng, respeito, hierarquia, etc. Agora em meio a pandemia, estamos realizando esse trabalho online, mais do que nunca para reforçar o vínculo dessas famílias e ajuda-los a superar esse momento. Em parceria com o CRAS trabalhamos com o serviço de fortalecimento vínculos e convivência. E isso é muito legal, porque o CRAS trabalha a família e nós trabalhamos as crianças. Vimos, além da necessidade de usar a cultura e esporte como ferramenta de transformação social, de sentar com os adolescentes e conversar sobre temas como protagonismo, economia, políticas públicas, para conhecer o que pode ser feito para mudar a realidade deles. Esse grupo foi criado em 2018 e o trabalho continua mesmo online. Tudo sempre focando no desenvolvimento pessoal e social e entender o papel deles na sociedade.
Como você enxerga a realidade social de Fernandópolis?
Faltam recursos, a gente sobrevive de doações e parcerias com o CDDCA e setor privado e nem sempre a entidade consegue ter pernas para chegar até onde a gente precisaria chegar. Falamos da parceria com o CRAS, para ressaltar o quanto importante é. Eles cuidam lá (da família) e nós cuidamos aqui (das crianças). As informações que temos são das pessoas que vêm nos procurar. Hoje, trabalhamos com 113 alunos, na faixa etária de 6 a 17 anos, e 92 famílias cadastradas que fazem atividades diárias aqui. Agora na época da pandemia percebemos uma demanda maior de pessoas vindo até nós. Além das marmitas em parceria com Sesi nos últimos meses, nos distribuímos cobertores. Temos ações de entrega de alimentos, cestas básicas. Passamos a atender pessoas que a gente não conhecia e isso foi um ponto que permitiu alcançar pessoas que a gente não alcançava antes. Notamos ainda que há dificuldade em chegar a mais gente que precisa.
"em sempre a entidade consegue ter pernas para chegar até onde precisaria chegar"
Como é trabalhar com a área social?
É muito gratificante. A gente aprende muito, principalmente quando percebemos o fortalecimento do vínculo com essas famílias, que chegam aqui e sentam para conversar com a gente, muitas vezes para desabafar, expor um problema. Eu digo sempre que esse espaço é deles. Temos crianças que começaram conosco e hoje estão em Tatuí fazendo aulas de música. São casos que tocam a gente e mostram a importância do Instituto na vida da comunidade. São vários os casos de crianças que passaram por aqui, se formaram profissionais e voltaram para prestar serviços para entidade. São pontos que revelam que eles precisam apenas de uma oportunidade. Isso mostra que essa organização da sociedade civil está cumprindo e muito bem seu papel de permitir que desenvolvam o talento que possuem e que possam mudar a realidade deles.